quinta-feira, 18 de março de 2010

Short cuts de uma vida curta


Um dia, entrei numa redação de TV com o desafio de apontar o rumo, fazer jornalismo, contar história. Cabia a mim ser o comandante de uma nau de insensatos e destemidos aventureiros. Havia um bocado de gente nova. Nova de idade. Nova de experiência. Uma novidade denunciada pelos olhos arregalados.

Foi assim que me vi fazendo parte do início de carreira de um monte de gente boa, predestinada a brilhar na profissão, determinada a ser jornalista de verdade. Dessas pessoas que trazem consigo paixão, tesão; que são capazes de contagiar com isso tudo o que se metem a fazer. Foi assim que conheci Serginho Carvalho, Myriam Violeta, Eliane Oliveira, Andréia Lima, Veruska Donato, Aldo Olarte, Adriano Furtado, Dary Junior, Anderson Carvalho. Uma tropa de meninos e meninas dispostos a enfrentar o mundo e fazer história. Qualquer história, a partir do bom exercício do jornalismo.

Era 1991. Era a TV Guanandi, retransmissora da Bandeirantes, em Campo Grande. E pra ajudar a dar o tempero a essa turma toda, contei com o apoio providencial de um camarada bem mais experiente do que todos nós – nem por isso, mais convencional ou mais previsível – Luca Maribondo.

Luquinha era o que hoje se costuma chamar de “dinossauro” da profissão. Não no tom pejorativo. Mas na temporalidade, no exercício e no conhecimento. Às vezes, eu pensava que a presença do Luca servia para impor respeito à gurizada. Outras vezes, via a gurizada cuidando do Luca como um bando de pastores em busca da ovelha desgarrada. Ele se divertia. E eu também.

Era um tempo bom. Fizemos escola. Fizemos um jornalismo inovador numa TV que tinha parcos recursos. Tratávamos a notícia com leveza e consistência. Com objetividade e humor. Aquele grupo de meninos e meninas desavisados invadia a praia do jornalismo endurecido. Brincando de fazer notícia, fazíamos notícia sem brincar. Fazíamos história.

Juntos, fizemos história quando o helicóptero do Exército caiu em Aquidauana e nós chegamos primeiro. Quando o pneu do papa móvel furou e ninguém além de nós estava lá. Quando cobrimos as greves, quando falamos de quem não podia falar. Fizemos história na cobertura política, com bom humor quando havia ranço. Com o frescor da juventude, quando tudo era velho. Com maturidade. Enfim, fazíamos tudo com tesão.

Um dia, o grupo se desfez, como tudo um dia se desfaz. Minha memória deve ter me traído e deixado alguns nomes de fora. Não é desrespeito, é a memória ou a falta dela. Alguns dos que eu falei já não estão mais aqui, como o Aldo e a Andréia. Saíram de cena mais cedo do que deviam. É uma pena, não deviam ter saído assim

Confesso publicamente que aquele foi e sempre será um dos momentos mais ricos da minha vida profissional. E é muito bom ver todos esses meninos e meninas terem virado gente grande. Uma gente grande que eles já eram, desde sempre, desde cedo. Por mais curta que seja essa vida. Ter estado com eles me fez uma pessoa melhor.

5 comentários:

  1. sempre generoso, amigo e irmão, caçula e paizão. este é o maranhão.

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  2. Maranhão, cheguei depois e encontrei uma Guanandi rica tb, com Wilson Soler, Oswaldo Nóbrega, Ângela Kempfer, Daiane Tamanaha, Luciane Mamoré e tanta gente boa... acho que a liberdade que tínhamos nos tornou ricos em criatividade. saudade de tanta gente

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  3. Maranhão, como você sabe eu não vivi esse tempo da Guanandi, mas entrei logo depois em outro cenário e conheci quase toda essa gente. Saudades daquele tempo de tantas amizades, descobertas, emoções e mentes criativas transbordando idéias pelas salas e corredores de Campo Grande.

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  4. Saudade! Quantas boas lembranças de um jornalismo de sangue. Éramos livres e combatentes de forças contrárias que nem sabíamos.
    Queríamos contar uma boa história, informar com qualidade e como tudo que é feito com arte, incomodar. E conseguimos!
    Foi lindo!! Foi lindo trabalhar com aquelas pessoas e construir relações bonitas de amizade. O melhor: trabalhar com você, Maranhão. Um super professor e amigo.
    Com carinho,
    Sérgio Carvalho

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  5. Grande maluquice foi aquela. Mas foi ótimo ter feito tudo aquilo. Todos os dias me vem uma lembrança daquela época, vem a saudades de todas aquelas figuras, incluindo você. Gostaria de ter uma outra experiência como aquela, uma das situações mais importantes que tive na minha longa vida de jornalista. Penso em tudo aquilo até por que todos os dias pratico meus vícios e pecados com imenso fervor. Minhas virtudes também, se é que as tenho.

    Só quero relembrar uma coisa: você me obrigou a colocar minha cara no vídeo, como analista que no fim das contas se tornou uma mescla de Arnaldo Jabor (ele ja era comentarista naquela época?), Paulo Francis, Alberto Dines e outros... Claro que sem o mesmo talento, mas com a mesma língua afiada. Lembra-se de que fomos ousados o suficiente pra criticar João Paulo II e o comandandante da Base Aérea de Campo Grande? Criticar um comandante militar em Campo Grande é algo impensável até hoje.

    Saudades de você, de Eliane Oliveira, Serginho Carvalho, Myriam Violeta, Veruska Donato, Adriano Furtado, Dary Junior, Anderson Carvalho, Aldo Olarte e Andréia Lima.

    Sem querer ser presunçoso, tenho certeza que realizamos o melhor jornalismo de televisão que jamais se fez por estas bandas, antes ou depois. Até porque nunca fizemos jornalismo a favor; estávamos sempre nadando contra a correnteza.

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