quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Achados e perdidos

Desfile de 7 de setembro, 1972. Eu, no primeiro plano,
Marcos Aurélio, em seguida.
Marco Aurélio de Figueiredo é uma amigo de infância. Estudamos juntos em Foz do Iguaçu. Eu tinha dez anos e estudamos na mesma escola até os doze ou treze anos. Esta semana, ele me escreveu através da internet. Achou uma foto da nossa escola.

O colégio.
Eram os anos 70 e naquela época, no momento da foto, a prefeitura duplicava a rua que passava em frente à escola. Bartolomeu Mitre era o nome do colégio. E fora os belíssimos anos de inocência, o que mais povoa a minha mente era a cor do uniforme: Calça bordô e camisa branca. Nunca vou saber por que se escolheu aquela cor de calça. Mas ela jamais vai sair da minha memória.

O tempo passou. Nos distanciamos. Ele foi para Curitiba e eu cai no mundo. Só voltamos a nos encontrar através da internet. Ele mora em Curitiba. E nós continuamos bons amigos. Desde a infância.

Cynthia
Coincidência ou não, hoje reencontrei, também com a ajuda da internet, outra amiga, de outros tempos de colégio, em Foz. Cynthia Pompeu Porrino.  Estudamos juntos no Colégio Anglo-Americano. Lembro que o pai dela era engenheiro e veio trabalhar na construção da Usina de Itaipu.

Nos primeiros tempos de Foz, a Cynthia morou em um hotel, perto das Cataratas do Iguaçu. Claro, era o local onde íamos nos reunir, fazer trabalhos escolares, jogar basquete, dançar. O Hotel Bourbon virou a casa da nossa turma por uns tempos.

Lembro que o nosso grupo era pequeno, mas intenso. Celi, Cynthia, Norberto, Paulão, Sálvio e eu. Depois, crescemos. Cada um tomou seu rumo. eu fui fazer faculdade no Rio Grande do Sul e de lá segui os passos que a profissão de jornalista me permitiu.

Marquinhos, hoje.

Cynthia, hoje.
Neste fim de semana, dois momentos distintos e duas imagens distantes me remeteram à infância e adolescência, ao  Paraná, a Foz do Iguaçu, aos tempos de escola. Coincidência ou não, essas lembranças só aconteceram por conta da internet e da capacidade de vasculhar o tempo através dela.

Ai, que vasculhando um pouco mais, encontrei esse filme francês que fala de um tempo em que as imagens virtuais são mais intensas do que as reais. E do risco de se perder a memória a medida em que passamos a contar muito com o fugaz.

Como um alerta: É ótimo alcançar as pessoas pela virtualidade, é delicioso rever o passado e suas imagens. Mas é absolutamente necessário reencontrar-se vivo enquanto estivermos por aqui. Marquinhos, Cynthia, vamos combinar?    


domingo, 22 de outubro de 2017

Memória bordô, escola e vinho

Fachada do colégio
O ano era 1976. Havia um quê de novidade naquele uniforme novo da Escola Estadual Bartolomeu Mitre. Calça bordô e camisa branca. Uma ousadia para os padrões da época, quando imperavam os uniformes azuis e branco. Vestir uma calça cor de vinho para ir à escola era um pequeno gesto, mas equivalia a uma imensa revolução dos costumes.

Não faço ideia de quem planejou a mudança. Mas quem quer que tenha sido, merece respeito. Pela coragem da proposta, pela quebra de monotonia que provocou em nossas vidas de estudantes, e pelo novo colorido das manhãs de segunda-feira. Era maravilhoso ver aquela multidão de meninos e meninas chegando à escola com seus uniformes de cor viva.

Eu estava lá, compondo a primeira turma da Reforma do Ensino, que instituiu, a partir dali, a nova estrutura educacional brasileira dividida em primeiro, segundo e terceiro graus. Deixando a infância pra trás e desvendando os mistérios e as delícias da adolescência.   Por uma coincidência dessas que a vida nos prega, minha mãe, Isabel, também frequentava aquela escola. Ela terminava o curso Normal e se habilitaria professora em pouco tempo.

Era bom saber que estávamos juntos, partilhando do mesmo espaço. Isabel e eu nos movíamos conforme o ritmo das aulas. Nossos grupos eram diferentes. Os meus amigos eram pré-adolescentes. Os dela, jovens senhoras, prestes a começar a vida profissional. Mas o sinal que alertava para o início da aula era o mesmo pra mim e pra ela. Da mesma forma como a sirene de perto do meio-dia era a senha para que nos juntássemos de novo e seguíssemos para casa.

Foz do Iguaçu, no extremo Oeste do Paraná, forma a tríplice fronteira que une Brasil, Argentina e Paraguai. Foi também o pedaço mais ousado da aventura geográfica que deslocou a minha família  das altas temperaturas do Nordeste brasileiro, para o Sul do país. Um contraste de culturas, um horizonte inédito, um conjunto de novidades que me fez aprender, havia vida além da ilha onde nasci.

Nosso autoexílio aconteceu por força de uma transferência militar do meu pai. O Exército queria mandá-lo pra longe de São Luis do Maranhão. Era o tempo de sair. E as alternativas eram o extremo Norte, no coração da Amazônia ou o extremo Sul, no Paraná. Chegamos em Foz juntos com o início da construção da usina de Itaipu. Eram tempos agitados. De milhares de operários e de alertas para os perigo da fronteira.

página do Jornal Gazeta Diário
Quatro décadas depois, acordo num domingo de chuva e recebo a notícia enviada por um amigo com quem estudei em Maringá, no final daqueles anos 70. Carlos Eduardo Pezzodipani hoje mora em Foz do Iguaçu. Ele folheava o principal jornal da cidade quando deparou com uma reportagem sobre os 90 anos da Escola Bartolomeu Mitre. E, lá pelas tantas, misturada a outros informações que ajudam a compor essa história quase centenária, ele se depara com um certo "Inorbel Viegas" a quem, junto com outra colega de turma, Enes Aguilar, é atribuída a criação da bandeira oficial do colégio.

Segundo o texto, a escolha foi fruto de um concurso escolar. Traído por uma memória que guardou essa conquista em uma gaveta distante, me surpreendo tanto quando o Carlos Eduardo. Talvez, um pouco mais que ele. A descoberta dominical tem o frescor de uma chuva leve, como a que cai lá fora. E pede a companhia de uma taça de vinho. O bordô do uniforme na memória agora se confunde com o vigor do alentejano, que perfuma o cristal e deixa mais viva a lembrança dos tempos idos. 

Na formatura do primeiro grau,
no Bartolomeu Mitre, com o uniforme bordô
e a companhia da professora Glória.

Hoje, o vinho tem a cor e a memória
daqueles tempos.