domingo, 13 de dezembro de 2015

Vinho, lágrimas e poesia


Havia 104 dias, eu não tomava um vinho com meu pai. Hoje, tomei. E foi especial. Meu pai e minha mãe estavam sós, em casa. E como tem acontecido nestes últimos tempos, me chamaram para almoçar com eles.

É um jeito carinhoso de pedirem a minha companhia, filho que desgarrou-se durante anos, mundo afora, e que o destino tratou de aproximar novamente.

Especialmente neste 2015, o carinho vem sempre acompanhado de um bom prato de comida. É delicioso o que comemos, deliciosa e fartamente, e o que termino levando – em boa quantidade – para me alimentar ao longo da semana. Artes de minha mãe, que não me deixa sair de lá sem uma “matula” generosa.

Os dois vivem uma fase bonita de se ver. Estão mais amadurecidos e menos presos às convenções (como nós, filhos, também vamos ficando com o passar do tempo). 

E esse amadurecimento pede carinho. Beijos, abraços, toques de mão, risadas, gestos que saíam um pouco mecânicos no passado, vertem agora com a leveza e transparência de água fresca, em mina nova.

Ao final do almoço de hoje, uma cena me comoveu. Falávamos sobre a poesia da vida. Sobre coisas que nos encantam. Eu dizia do meu encantamento de ter visto o filme do Chico. E meu pai começou a lembrar de algo marcante na vida dele – um apaixonado por literatura.

Me contou o ocorrido, sem saber ao certo a data em que acontecera. Pelas referências e pelos personagens, creio que foi antes de 2010. Ele estava em uma feira de livros, aqui em Brasília. Tinha nas mãos um livro de Fernando Pessoa. Lia, entretido com a escrita do poeta lusitano, quando três senhores se aproximaram dele. Foi uma passagem rápida. Um deles comentou a leitura olhando para o meu pai. “É pessoa”, disse o interlocutor, como que puxando conversa.

Meu pai virou-se num espanto e identificou, de imediato, três dos seus grandes ídolos. Ali, bem perto, de uma só vez: Affonso Romano de Sant’Anna, Moacir Scliar e Armando Nogueira. E perdeu a voz. Confirmou com a cabeça que, sim, era Pessoa. Os três o cumprimentaram e comentaram algo que ele não se recorda direito. Penso que por culpa da emoção.

O breve encontro terminou com um aperto de mão e a confirmação, graças a um cartão, de que eram mesmo os seus ídolos, em carne e osso. Depois disso, meu pai ficou um tempo ali parado. E os três seguiram para o local onde participariam de um debate com o público, um dos atrativos da feira.


Affonso Romano de Sant'Anna
Armando Nogueira
Moacir Scliar
Enquanto me contava isso, meu pai desandou num choro compulsivo.  Choro de menino saudoso, melancólico. Ele me olhava, entre um soluço e outro, e dizia: O que é isso? Não sei o que me deu pra chorar assim!

E chorava. E eu, compreendendo sua emoção, estendi-lhe a taça de vinho em que eu bebia. Meu pai chorava por uma lembrança vivida e guardada secretamente. Se o tempo pudesse voltar, ele me disse, eu pediria um autógrafo dos três. Mesmo que fosse num livro que não era deles

“Só o Affonso ainda está ai. Havendo um novo encontro, não perderei a oportunidade” – ele planeja, secando o rosto.


Havia 104 dias, eu não tomava um vinho com meu pai.    


quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Dia do Pantanal

Por Raquel Anderson

Datas Comemorativas passam incólumes


Como vaga-lumes, alegrias e queixumes brilham e ofuscam o imaginário da gente e a certeza na mente de que o monumental Santuário Ecológico é a referência mor, o eldorado do passado e a miragem que assombra de incertezas a manutenção dessa beleza, onde o Homem cuida, descuida, protege e, como fez Francelmo, mais que a utilização de um elmo, ele deu sua vida, certo de que a contrapartida seria o compromisso, sublimou com sua atitude contundente, engendrou-se com a força que queima, solidificou-se na simbologia maior da coragem seu grito eterno que ecoará no cenário mundial as fragilidades do Pantanal.

Manoel de Barros
Manoel de Barros versou, o mundo todo ele encantou com seu olhar brejeiro e suas observâncias, eterno menino se fez e nos levou ao paraíso pantaneiro.

Paulo Simões
Paulinho Simões e Geraldo Roca nos ensinaram como uma oração, no mais iluminado momento de inspiração, ”que o medo viaja também sobre todos os trilhos da terra, enquanto este velho trem atravessa o Pantanal” sem imaginarem que estava dado o sinal para o hino não oficial que de forma magistral não cansamos de ouvir na bela voz do Almir.

Aprendemos com a oralidade da literatura pantaneira e cravamos na retina do nosso olhar com o despertar da imaginação e curiosidades, onde o empírico sobrepõe o científico e o prazer da leitura in loco nos embrenha no mato, onde extraímos os mais nobres ensinamentos, todo encantamento advindo da natureza, dos bichos, da relva, da bosta da vaca, dos silêncios na mata, do cavalo que transpira parado, da beleza do arrebol, da isca no anzol e, como o Manoel, “beato de ouvir prosas dos rios” ali passamos noites a fios a espreitarmos a onça, a aprendermos que elegância e delicadeza residem no andar devagarinho, pé ante pé, cuidado com o jacaré, com o filhote do passarinho, com a leveza da borboleta, com as rãs acordando as manhãs repletas de magias , consumidos pelas alegrias reverenciamos o Pantanal e seu ator principal, o Homem Pantaneiro, invocando Manoel, o que é um privilégio, através de  seu relato que, de fato, é o Homem Pantaneiro,” um florilégio de abandono”!!!
Geraldo Roca
Almir Sater
Feliz Dia do Pantanal a todos os seres vivos, aos bichos que já morreram e aos seres humanos que no Pantanal viveram e nos deixaram indeléveis lições de cultuação e gratidão ao bioma mais magnífico do planeta!!!



sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Da fonte


Da minha janela, não vejo o mar.
Mas sinto a brisa.

Da minha janela, não vejo o mar.
Mas tenho o coqueiro a embalar manhãs e tardes
e a me proteger o do tempo. Como se fosse sempre
dia de domingo.

De quebra, da minha janela tenho o fruto, da fonte.
Água de côco, direto do pé.
Ao alcance das mãos. E da imaginação.

Da minha janela imagino o mar.
E ele tem sabor de água fresca de côco.

Porque hoje é sexta.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Mochileira


Geraldo Roca é um grande amigo e um dos mais importantes letristras e músicos do Mato Grosso do Sul. Ele vem da geração primeira, dos novos valores da terra. É fruto de um tempo, de uma lufada de vento, que trouxe à tona  Geraldo Espíndola, Tetê Espíndola, Almir Sater, Paulinho Simões, Guilherme Rondon e tantos outros.

Hoje, acordei com essa música. Procurei e encontrei um vídeo, de um show que assisti ao vivo, ainda lá em Campo Grande. Pra matar a saudade e pra celebrar a vida. Mochileira. A original. Com Geraldo Roca.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

O Deus Mu dança



Na quarta, enquanto eu "mudava" flagrei esses pássaros "cantando".
A quarta-feira, 30.09, seria intensa. 
O último dia do mês era também o meu último dia no apartamento do Bairro Noroeste. Estava de muda para o Bairro Sudoeste. Meu movimento tem a ver com as exigências do novo tempo. Tempo de baixos rendimentos, tempos de cortes nos gastos, tempo de ajustar a vida para o tamanho que caiba no bolso.

Como toda mudança, aquela também tinha lá seus registros. A gente se acostuma fácil com os ambientes. Principalmente, aqueles que se tornam a nossa morada. Me acostumei às ruas do meu bairro, à padaria, ao fluxo do trânsito, ao Parque Burle Marx - ainda que, inacabado. 

Fui me acostumando à poeira e à chuva de um lugar que não estava completado. Um ano de morada foi tempo suficiente para perceber a lindeza do horizonte e o bem que ele me fazia, todos os dias, ao abrir a janela.

Naquela quarta, sai da cama pensando nos passos necessários. Para ir ao banheiro, para chegar à cozinha, para alcançar o café, para ligar o rádio. Tudo, tudinho, decorado mentalmente. Minha casa me servia como uma velha e boa calça jeans, daquelas por quem a gente se apaixona fácil. Vou sentir saudades, pensei.

Mas, a mesma nostalgia que me invade pela partida cede espaço à novidade do que é inédito, do desconhecido. Pelo desafio e pela surpresa do que está por vir.
Em meio a esse caldeirão de pensamentos e lógicas, recebo uma mensagem por  Whatsapp, do Mauro Di Deus. 

O "zap" do Maurinho
Em resumo, ele me dizia que foi à banca de jornais da Quadra 308 Sul e se lembrou de mim. É que o dono da banca, o Márcio, o recebeu com um impresso em que comunicava, também, uma mudança.

A banca, que ele tocava havia 20 anos, estava mudando de mãos. E ele, além de despedir-se dos amigos que fez (mais do que clientes), aproveitava o comunicado para apresentar a nova proprietária: ninguém menos que Conceição Freitas, a jornalista de texto limpo e brilhante, que preencheu as páginas do Correio Braziliense por muitos anos, com preciosidades, que só quem entende da alma de Brasília pode produzir.

Mauro lembrou do texto que escrevi no dia em que eu soube da notícia de que Conceição deixara o Correio. Ele fotografou o impresso que recebeu e me mandou, como prova de que o que relatava era a mais pura verdade. Como se isto fosse preciso. As informações vindas do Mauro são precisas, nunca alcançaram a raia da dúvida.


Por um instante, parei. Pensei comigo: a mudança não é só minha. Pensei na conjugação daquele verbo transitivo direto, mudar.

Eu mudo,
tu mudas,
ela muda,
nós mudamos
e um novo mundo nos absorve em mudança.

Conceição Freitas, na redação
Hoje, dia em que me sinto definitivamente instalado em minha nova morada, vizinho do Parque Sucupira, meu novo local de corridas, é também o dia em que Conceição Freitas, literalmente, “bota banca”.

Pois, então, está decidido: antes que o dia termine, vou dar-lhe um abraço e desejar que o horizonte dela seja tão promissor quando a alegria que sinto agora.

Fui levar o meu abraço à Conceição. Quis o destino que
eu encontrasse pro lá o Mauro Di Deus e o Márcio
De jornalista a jornaleira, dona do seu nariz e do seu próprio negócio. 
Sorte ai, Conceição.
Sorte pra todos nós!

Porque, como diz o velho e bom Raul, é preferível ser essa metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo!   


PS. Conceição vai ser mais do que vendedora de jornais. Na conversa de fim de dia que tivemos, ela me conta que a banca vai seguir vendendo jornais. E vai também se tornar um ponto de referência para todo mundo que quiser conhecer melhor Brasília e as suas histórias.

domingo, 4 de outubro de 2015

O aniversário e o time do coração

Viegão em dia de festa. 

Aniversário do Viegão.
Isabel não para.
Os filhos, os netos, o genro, as noras, os amigos queridos, os poetas, os que não faltam nunca. Tanto, que minha mãe considera Bia, sua melhora amiga, também a sua irmã. E elas crêem tanto nessa irmandade que até se parecem fisicamente. Na alma, então…

O bocão de Mariana, em primeiro plano. Isabel, depois,
Bia, a irmã de alma, e Heronisa.
Estavam lá. Todos.
A casa numa efervescência só.

E livros. Muitos livros.
Viegas gosta de livros. Ganhou livros.

Com Zezinho, à esquerda, e o poeta Fagundes, à direita. 

Cartas da Humanidade - de Marcio Borges. Uma vida entre Livros - de José Mindlin. A Imperatriz de Ferro - de Jung Chang.

Leitura garantida pelas próximas semanas (ele prometia começar ontem mesmo, depois da farra. Não creio. Mas não descreio).

Enquanto conversávamos o tempo passou. Já era noite quando a turma foi embora. Juntamos a louça para lavar e aliviar o cansaço da mãe. Do outro lado do balcão, observando a lavação, Viegas fez uma reclamação - Aniversário sem vinho!

Calma, homem. Nem demora e a gente toma um juntos - eu disse. Abra ai uma cerveja, deixe de coisa, e vamos falando. Nas falas, a lembrança do passado veio pelo resultado do futebol. O Sampaio Correia, time que lidera o campeonato maranhense e disputa a segunda divisão do Brasileiro, empatou com o Botafogo. tem chances de subir para a primeira divisão.

Bastou esse gatilho para a memória do Viegas disparar. O Maranhão já teve bons times, diz ele. E segue falando. Eu sou "motense", torcedor do Moto Clube de São Luis. Um time formado por um grupo de motociclistas que se reunia para andar de moto e jogar futebol. Viraram profissionais. O escudo era uma roda de moto com asas. Teve um belo time. Chegou a ser chamado de "Papão do Norte" e até enfiou um 5 X 0 no Flamengo, em pleno Maracanã.

A memória segue lúcida e falante. Tem também o Sampaio Correia, Sabe por que esse nome? Não, pai, não sei. Era o nome de um Hidroavião que "amerissou" (termo usado para o pouso de aeronaves aquáticas) em São Luis, em dezembro de 1922 e ficou muito famoso por isso.

As cores do Sampaio são o verde, o amarelo e o vermelho - iguais às cores da Bolívia. Por isso, lembra meu pai, os torcedores do Sampaio são chamados popularmente de "bolivianos".

Entre um gole e outro de cerveja, Viegas me lembra algo que eu mesmo já havia apagado da memória: Um outro time, menor, menos famoso, mais capaz de me causar uma enorme emoção. O time formado por estivadores do porto de São Luis. E qual o nome do time? Vitória do Mar.

Que beleza de nome. Poesia em estado puro. Se eu não tivesse nascido motense, por força da predileção do meu pai, eu hoje seria torcedor do Vitória do Mar. Menos pelo futebol. E muito mais pela poesia do nome.

O time campeão de 1952, Vitória do Mar.
O camarada que está marcado na foto é Misael.
E eu o conheci, em minha infância, enquanto morei na Madre Deus
Pesquiso na internet e vejo duas coisas sobre esse time. Primeiro, ele foi campeão invicto do campeonato maranhense, de 1952. Pra nunca mais ganhar nenhum título. Segundo, a sede do Vitória do Mar fica no "Paço do Lumiar". Pronto. Nem precisa dizer mais nada. Sou motense. Mas meu time de coração, desde ontem, aniversário do meu pai, é o Vitória do Mar.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Eram tempos de Luiza Romão


Conheci essa menina pelas mãos de Gabriel, meu filho.
E fiquei encantado.

Enxerguei nela uma vitalidade que havia tempos, não via.

Ode aos touros Furiosos é um libelo à liberdade e ao respeito. É mais, é uma fina esperança de que nem tudo está definitivamente perdido, nesses tempos de intolerância e futilidade.

Luiza tem o frescor de uma juventude que gasta o seu tempo com algo mais que facebooks. Tem o vigor de quem conhece literatura, de quem bebe da mesma água que saiu do pote de Guimarães Rosa ou Leminski.

Hoje, eu conheci Luiza Romão. Acho que não esqueço mais dela. Valeu, Gabriel!


E já que você chegou até aqui, aproveite, gaste mais sete minutos e conheça um pouco mais da guria!

sábado, 5 de setembro de 2015

Tempo de entregas


O tempo é de entreguidão.
Minha curta vida de 53 entra em fase de desapego.
Entrego para guardar. Entrego sem solfejo tudo o quanto já não me pertence.

Assim, me preparo para receber o resto que me resta de vida.
Não há senão uma pequena dor no corpo – talvez, da vesícula que já me avisou, 
quer também sair de mim.

Torço por uma despedida sem litígio. 
Peço-lhe em silêncio que aguarde um pouco mais.
O tempo do desapego vesicular ainda se faz em construção.

Do ouvido caverna que tenho do lado esquerdo da cabeça, o eco oco é sem sentido.
Um zumbido que me acompanha desde que entreguei, também, meus instrumentos auditivos, que me situavam melhor ante o mundo.

Nesta manhã de sábado abro o meu jornal virtual 
e dou de cara com o meu melhor poeta vivo, Ferreira Gullar.
Está aos 85. Seu tempo de entrega é mais longo. Seu desapego, maior.

Ferreira Gullar
Foto: Zô Guimarães/Folha Press
Vô Opílio
Pensa com todas as letras em não mais escrever poesias. Não que não as queira mais. Elas é que não lhe vem como vinham antes. Elas e o espanto com o mundo que lhe alimentava a inspiração. O mundo, diz o poeta, já não lhe espanta mais.

O olhar sisudo de Ferreira, sua parede de quadros, sua lentidão nos movimentos, seus longos cabelos brancos. Tudo, em Ferreira, é majestático.

Leio atentamente com um pesar intraduzível. Ferreira é mais do que meu poeta vivo. Maranhense, como eu, é de um tempo que conheço apenas nas descrições imaginárias de meu avô Opílio.

Nessa manhã de sábado, a consciência desse tempo de entregas me faz perceber melhor a passagem do tempo. Meu filme vital explode em meu pensamento.

Corrida na chuva; jogo de bola-de-meia na fábrica de arroz; banhos matinais no tanque da casa de tia Luzia; bolinha de gude; caminho da escola; areia branca e mar. O mar salgado da areinha. 

O mar esverdeado de minha ilha de São Luis. A ponte, as comportas da represa, o bairro do Anjo-da-Guarda, a Madre Deus e seus sotaques – matraca, pandeiro, caboclo de penas, mãe Catirina e pai Francisco. 

Meu primo Jorge, minha tia Dica, Bunbunga, Coscotô, Nildo, Junior Carajás e Carlinhos carretel. Djé e seus olhos grandes. Eis o meu time de infância, eis meu espelho matinal dos dias em que estive menino.

Leio, escuto, penso. Há uma sede de que esse tempo não dure tanto. 
De que essa seca de horizontes se molhe enquanto há dia, enquanto os ipês florescem nas ruas.

Nessa manhã de sábado de entregas, entrego meus desejos ao acaso e à sensibilidade dos que me guiam, me protegem e me guardam.


A poesia, enfim, segue comigo.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Carta para Margot

Foto: Sheyla Leal

Querida Margot.

Os dias são quentes e secos em Brasília.
Eu escuto um blues, a seco, como se isso fosse solução, mas não é.

O blues tem apenas a capacidade de nos tirar da letargia. 
De espantar a falta de esperança e a tristeza dos dias.

Os dias são tensos. Intensos.
Tudo é velho no Front.
Nada de perspectivas boas no ar. 
Tudo é incerto. 
E ainda assim, é preciso insistir.

Meus filhos, Mariana, 27, e Gabriel, 23, nunca tinham conhecido 
o sentido da palavra "crise" como sentem agora.

Os dias são tensos e carecem de esperança. 
O Brasil anda sem rumo, feito nau desgovernada.

Governo? Nada.
Nada de braçada na incerteza.

De novo? Nada. 
Nem lá, no Planalto, nem aqui, na Planície.

E ainda assim, vamos tendo que achar sentido.
Na florada dos ipês, por exemplo. 

De amarelos, 
de tão intensos que são, 
de tão fugaz amarelidão,
eles carregam o dom de nos iludir.

Ilusão boa, essa que eles nos dão.

Invadem, sem pedir licença, as inéditas manhãs de setembro 
e, feito mágica, nos fazem achar que vamos ter forças pra dar jeito.

É o que nos resta.

Um pouco de cor e poesia, pra enfrentar os nossos velhos dias.

Dias tensos, em Brasília.


Besos, desde aqui.

Maranhão. 

Margarida Margot Marques é jornalista. 
Já não está conosco.

E mesmo já tendo ido daqui, vai continuar sendo, pela eternidade, uma das maiores jornalistas que conheci. 
Um bom pedaço da vida, passamos juntos em terras sul-matogrossenses. 

Margot era um amor que eu tinha. Foi minha comadre, madrinha de Mariana. E, de vez em quando, bate uma saudade imensa de conversar com ela. 


Resolvo a saudade escrevendo. 
Algo me diz que ela lê. 
Algo me diz, ela me entende.