quinta-feira, 29 de abril de 2010

Olhar de Fotógrafo



Roberto Higa é um japonês criador.
Olhar inconfundível, ele e sua máquina já passaram por muitas e boas. O conheci na longa jornada que fiz em Mato Grosso do Sul. Tive o prazer e a honra de trabalhar com ele, inúmeras vezes.

Hoje, ele me escreveu (coisa rara), me mandou uma foto e me deixou cheio de alegria. Pela lembrança, pelo contato e por saber que o velho Higa de guerra continua o mesmo: preocupado e atento.

A foto que ele me mandou, e que está aí acima, fala por si só. É a cara do Higa. Ou das preocupações e da sensibilidade dele. Caminhando pela estrada parque do pantanal, Higa flagrou um pássaro construindo o seu ninho. A sequência de imagens ele batizou de "Graveteio"

Tudo certo não fosse o fato das sacolas plásticas terem virado matéria prima da construção. Um desequilíbrio ecológico perturbador. Uma modernidade sem graça.

No e-mail, ele me diz que resgatou a foto porque, há algum tempo, um projeto que proíbe o uso de sacolas plásticas está parado na Assembléia Legislativa. A divulgação da foto é um alerta e uma forma de protestar.

Higa termina a mensagem dizendo assim: “Apesar do modismo sobre conservação do meio ambiente, pouco se faz por aqui, no nosso pantanal”.

A taça e o feixe



Uma Taça de vinho e um feixe de lápis.

Assim, juntos, eles traduzem uma associação livre - companhia.

A taça contém o vinho que me alimenta a alma.
O feixe de lápis de cor me dá idéia de união e
não me deixa faltar a matéria prima da minha escrita.

A taça e o feixe estão tão intimamente ligados
que os conservo em minha mesa.

Como um totem.
Como uma obra do acaso.
Como uma ilha de sossego e fé.

Minha esperança prossegue
entre a taça e o feixe.

Lá de Montes Claros, o Cácio Xavier, jornalista da Globo e professor de jornalismo, me manda o seguinte recado:

Oi gente, bom dia!

Acaba de ser publicada no Jornal O Norte, a oitava edição do Suplemento Literário Seo João. O webdesigner Jadir Santos também já atualizou o site www.seojoao.com.br . Neste número temos uma entrevista feita pelo Prof. Dr. Rodrigo Nascimento com Evando Nascimento - Uma conversa sobre desconstrução, feminismo e literatura; Marcelo Antunes, mestrando do Programa de Pós-Graduação em Letras / Estudos Literários da Unimontes, nos brinda com o artigo Henry Miller, o Argonauta Metafísico; e ainda a crônica Magaba do Prof. Ms Waldir Pinho Veloso, membro da Academia Montesclarense de Letras. As ilustrações foram feitas por Gilson Neves, mestrando do PPGL/ EL/ Unimontes.

Visite o site e boa leitura!

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Caminhos de Helena e Mel

Helena esperava o pai na saída da escola. Ele chega e a viagem de volta pra casa começa.

No caminho, avistam uma cachorrinha.
- Pai, ela está perdida. Volta lá, temos que salvá-la. Quem perdeu deve estar desesperado, pai!!

Ronaldo não resiste aos apelos de Helena.
Volta, apanha o cachorrinho, que em verdade, é uma cachorrinha.
Mel. Como mais tarde se iría descobrir.

O dia passa.
- Pai, se ela ficar aqui ninguém vai encontrá-la.
Já sei, vamos fazer uns cartazes, pai.
- Que mané cartaz, Helena!
- Mas pai...

Os cartazes são feitos.
E são espalhados na redondeza do prédio, em bares, escolas, lanchonetes, paradas de ônibus. A informação no cartaz destoa do comum:
Fui Encontrada e o telefone do Ronaldo.

No fundo, no fundo, o que Helena queria era uma paz na consciência. E que o dono mesmo não aparecesse, porque já havia paixão entre as duas.



Pouco tempo depois dos cartazes serem espalhados, claro, pintaram uns trotes antes que o verdadeiro dono aparecesse. Ronaldo teve certeza de que era ele porque a cachorrinha reagia aos grunidos estranhos feitos ao telefone.

Esta semana, a avó do cara, a verdadeira dona da Mel, e suas duas netas foram à casa de Helena. Primeiro agradecer pelo cuidado e pela iniciativa de espalhar os cartazes em busca dos donos de Mel. Depois, para deixar a cachorrinha passar um fim de semana com Helena. E, numa lição de desprendimento, a avó propôs: Caso as duas se dêem bem, não seriam mais separadas. (elas estão aí embaixo. Helena está de blusa branca e saia jeans)



Não sei dizer qual delas é maior: Helena, a avó ou a Mel. Na gentileza, no respeito, na compreensão, na entrega e no amor. Coisa rara de se ver.
Tenho pra mim que Helena e Mel nãos se separam mais.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Sem previsão para deixar o hospital


Oscar Niemeyer, de 102 anos, foi internado em um hospital do Rio de Janeiro na noite de domingo com infecção urinária, informou o escritório do arquiteto nesta segunda-feira.

A assessoria do Hospital Samaritano confirmou a doença de Niemeyer. Segundo o boletim médido assinado pelo médico Fernando Gjorup, seu quadro é estável, mas não há previsão de alta.

Niemeyer passou quase um mês internado no mesmo hospital entre setembro e outubro do ano passado, após se queixar de dores abdominais.

Ele foi submetido a duas cirurgias para retirada da vesícula e de um tumor do cólon do intestino e passou alguns dias no Centro de Terapia Intensiva (CTI).

O arquiteto, que completou 102 anos em dezembro, tinha participação prevista na terça-feira no lançamento da edição especial da revista "Nosso Caminho", em homenagem aos 50 anos de Brasília. A festa foi cancelada.

* Com Reuters e Agência Estado

NIEMEYER INTERNADO NO RIO

Acaba de ser noticiado no Blog do Riella:

Aos 102 anos, o arquiteto Oscar Niemeyer foi internado hoje no Hospital Samaritano, no Rio.

Não se sabe as causas que o levaram ao hospital.
Niemeyer é o arquiteto que, a pedido de Juscelino Kubitschek, desenhou os principais prédios de Brasília.

domingo, 25 de abril de 2010

Torresmo no Mercado Municipal

Margarida Marques esteve em minha casa, por três dias. Sempre pensei em escrever uma série sobre “as mulheres da minha vida”. Quando um dia eu criar coragem para fazer isso, Margarida terá um capítulo especial.

Ela é jornalista, gaúcha, elegante, sincera, adora vinhos e... é nossa comadre. Madrinha de Mariana.

Margarida tem presença incontestável na nossa vida. Lembro de uma vez. Fazia três dias que Mariana havia nascido. Eu e Mara, pais de primeira viagem, enfretamos uma crise de choro da guriazinha.

Foi uma longa e exaustiva crise. Hoje compreendo que, quanto mais ela chorava, mais ficávamos nervosos. E o nosso nervosismo, de alguma forma, colaborava para que ela continuasse a chorar. Sem uma razão física qualquer. Tentamos de tudo e nada resolvia.

Quando a gente não tinha mais pra onde correr, a não ser para o hospital, eis que soa a campainha. Eu estava com Mariana nos braços, ela chorando e eu, quase. Começava a anoitecer. Abri a porta e apareceu a Margarida.

Eu nem dei boa noite, nem nada. Entreguei Mariana a ela. Como num passe de mágica, Margarida agasalhou Mariana nos braços, fez meia dúzia de carinhos e a guriazinha desmaiou, como um anjo. Eu e Mara, a partir desse dia, passamos a acreditar nos dons divinais de Margarida.

Essa é só uma das muitas histórias deliciosas que relembramos, nestes dias. No sábado, fomos apresentar o Mercado Municipal de Brasília para ela. O mercado é um lugar mágico. Fica na 509, da W3 Sul. Sua fachada destoa do restante das outras casas comerciais da rua, remete a antigos casarões, no melhor estilo Art Nouveau, que marcaram um período da arquitetura e que se caracterizam pelo uso de ferro fundido, arcos, grades e vitrais.



Quem conhece outros mercados famosos, como o de São Paulo ou Recife, vai se identificar imediatamente. Lá dentro, cheiros e sabores se misturam e formam uma harmoniosa combinação, um convite à permanência sem pressa, sem hora para terminar.



Na banca do "Manel Xicote" lembrei do meu pai e da fissura que ele sente por este lugar. Cortes especiais de bacalhau, azeites, azeitonas, presunto parma, queijos especiais. Tudo, na banca do Manel Xicote é tão especial quanto a própria história da criação da logomarca, que saiu da cabeça do Ziraldo.


A caminhada pelo mercado é uma provocação. O plano era passar rapidamente por lá. Mas isso é quase impossível. Resolvemos nos sentar na parte de cima, que nos permite uma visão ampla e geral do mercado.

Foi lá que encontramos o Mauro Di Deus. Quase saindo, depois de comer um filé de tambaqui. Comemoramos o encontro e o Mauro terminou ficando um pouco mais do que também havia planejado.

Foi uma tarde esplendorosa, recheada de boas histórias, bom chopp, caipirosca e muito torresmo. O encontro, certamente, vai render mais algumas boas histórias aqui no blog. A pauta foi extensa.

Uma exposição de um holandês, com fotografias de 1957, quando Brasília não passava de um canteiro de obras; o início de uma biografia que o Mauro está ajudando a escrever; as visitações publicas ao Congresso, que ganham a partir de agora um atrativo a mais – serão conduzidas por atores e atrizes, representando personagens ilustres da história da cidade; um painel sem assinatura, feito especialmente para o Salão Verde... Olha, a ida ao mercado rendeu muito. Rendeu até uma cena inusitada.

Além do chopp, pedimos uma porção de torresmo. Na mesa que ficava imediatamente atrás da nossa estavam duas das figuras mais célebres da MPB: Ronaldo Bastos e Fernando Brant. Compositores, parceiros de Milton Nascimento em alguns dos grandes clássicos do Clube da Esquina, só pra ficar no óbvio. Eles conversavam animadamente até que o garçom trouxe o nosso pedido.

Assim que ele deixou a porção de torresmo na mesa, Fernando Brant parou de falar e olhou com um olhar de cobiça, incontrolável. Todos que estavam na mesa dele se voltaram para a nossa. Percebendo o encanto com o torresmo, sugerimos que eles se servissem do nosso prato. Eles sorriram, agradeceram educadamente e pediram um igual.

Uma pena, porque pra nós, teria sido uma honra dividir o nosso torresmo com a nata da MPB.

sábado, 24 de abril de 2010

Brasília de Oliveira Kubitscheck

Acabo de assistir uma entrevista de Ronaldo Costa Couto a Armando Rolemberg, na TV Senado. Uma conversa limpa, gostosa e com sabor de história viva. Além de escritor e historiador respeitado, Ronaldo foi um pouco de tudo, no ambiente político de Brasília, inclusive, governador do DF no período em que Sarney era presidente da República.

A entrevista faz parte dos trabalhos especiais que a TV Senado fez, em homenagem aos 50 anos de Brasília. E Ronaldo vai revelando ao longo do programa detalhes que só alguém com dedicação à pesquisa e à investigação histórica podem alcançar.

A uma determinada altura da entrevista, ele lembra que um dos grandes méritos da construção de Brasília foi a interiorização do Brasil. No rastro desse movimento, o Brasil, que vivia de costas para o interior, descobriu um solo fértil e um espaço livre e rico para ocupar.

Lembra também que, na década de 50, o Brasil tinha aproximadamente 60 milhões de habitantes. A maioria, concentrada numa estreita faixa litorânea, de Norte a Sul do país. Hoje, estamos perto de 200 milhões de habitantes. Imagine, diz ele, toda essa gente espremida no litoral, como não seria a nossa vida?

Aos críticos da construção da cidade, Ronaldo Costa Couto informa que a idéia de transferir o poder central para o interior habitava o imaginário de JK desde os tempos em que era deputado federal, na década de 40. E conta que há um momento na história, nessa época, em que ele e Israel Pinheiro, também deputado, articularam para levar a capital do Brasil para o Triângulo Mineiro. Perderam a votação por poucos votos, mas registraram o desejo que, mais tarde, se transformaria em obstinação política da vida de JK.

Ao final, se despede mandando um abraço para a terceira filha de JK. Como se sabe, Juscelino teve duas filhas: Marcia e Maria Estela (essa, adotada). A terceira, segundo Ronaldo Costa Couto, seria Brasília de Oliveira Kubitscheck. Título de um dos vários livros dele.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

A 120 por hora, num karmann Ghia


Meu telefone toca. A manhã preguiçosa do aniversário de Brasília se estica, sem compromisso com o tempo. Do outro lado da linha a voz do meu pai, rodeada por um barulho intenso de vento.

Tu me ligastes?
Sim, pai, queria saber onde o senhor estava.
Estou num karmann Ghia, a 120 por hora, eu e o Zezinho.

Zezinho é o melhor amigo do meu pai. Companheiros de aventura. Comecei a rir. O que estariam os dois fazendo num Karmann Ghia, a essa altura do campeonato?
Hoje o dia é especial, me diz ele: 50 anos de Brasília. 39 anos da fundação do GODF. Resolvemos tirar uma “onda”.

Meu pai, me faça o favor de passar aqui em casa, no seu retorno. Preciso registrar esse momento. Combinado, responde ele, rindo e feliz, como um menino sapeca.

Não deu 20 minutos e os dois estavam fazendo furor, na porta da minha casa. Dois velhinhos transviados. Dois meninos grandes (o "seo" Viégas é o da esquerda, na foto lá em cima). Duas almas felizes, num dia especial.


(não resisti e também peguei carona no sonho deles. Não sei quando terei outro desses nas mãos)

Brasília 50!





As fotos aí acima, pertencem ao Arquivo Público do Distrito Federal e, hoje, ilustram uma campanha publicitária do Banco do Brasil, publicada nos principais jornais e revistas brasileiros, em homenagem aos 50 anos de Brasília. São o retrato fiel de um sonho realizado. Um retrato do Brasil.

A síntese da mensagem diz: “Um homem sonhou. Um arquiteto e um urbanista planejaram. E milhares de candangos tornaram esse sonho realidade.”

Não é preciso dizer muito mais para compreender Brasília.

O dia de hoje, em Brasília, é feliz. O sol aqueceu a manhã, o verde invadiu as ruas. O azul do céu tomou o horizonte. Tenho a impressão de que começamos uma nova história, definitivamente. Uma história capaz de honrar o sonho de JK, de Lúcio e Niemayer.

Uma história da qual, intimamente, me orgulho de participar. Uma história capaz de honrar a todos os brasileiros.

Feliz aniversário, Brasília. E muito obrigado pela acolhida.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Declaração de amor por Brasília


foto: Alessandro Dantas

Caro amigo Maranhão,

Em falta de boas notícias do Rio de Janeiro, lembro-me de colaborar com o Blog do Maranhão e busco na poeira dos arquivos um poema que escrevi há 10 anos, no curto período em que morei em Brasília.

É cidade (lugar? maquete? ficção?) que amo e que povoa minha imaginação desde muito criança, quando ainda não acreditava que aquela maravilha modernista cujas fotos eu via nos calendários existisse no brasil.

Pois morei aí, na condição típica de servidor federal em treinamento, em 2000. Caminhava pelos gramados do eixão, por baixo dos blocos, da sudoeste até a rodoviária, via gente e coisas triviais, e voltava...

Era o que sempre quis fazer, desde quando passava rapidamente pela cidade no trajeto improvável Calvador-Campo Grande... desde quando em Brasília não havia semáforos, muito menos engarrafamentos...

Umas 20 e tantas vezes passei por Brasília, apenas uma vez morei nela, e só o que tenho para ela em seu aniversário é um poema empoeirado, que nasceu nela, de seu pó e sua luz.

Pensei que talvez você pudesse publicá-lo no blog, o que muito me honraria.

Segue aí poesia:

A nave em corpo de ave
deita as asas duras no solo infértil
feito sombra, feito pele
feita à mão desde o alto
para ainda acima ser notado seu gesto imperioso.

O barro de muitas mãos,
o pó sobre muitas vontades
se transmutaram em palácios para as torres mais altas
altares para todo sacrifício
muros invisíveis contra toda rebeldia.

E o mar imenso despencou das nuvens
em véu suspenso nas arestas ideais.

A língua tímida do lago lambe e consola
a proa a prumo do horizonte veloz.

Planos eixos plataformas no centro deserto
fazem girar arraial satélites nação
em torno do umbigo sagrado da aldeia
asas retas orgulhosas coladas ao cru do chão
em asfáltica oferenda

Dança metálica
lavoura de pedra a romper o sertão
de onde só as vê e se vê nelas quem
sabe seu lugar no ritual perpétuo
cometido ao espanto e deleite dos deuses.


Angelo de Souza é jornalista, vive no Rio de Janeiro, apesar de ter o coração espalhado por vários pedaços desse imenso Brasil. Tem green card no blog. Pro que der e vier.

domingo, 18 de abril de 2010

Estrela: solitária e campeã!


Homenagem deste blog aos botafoguenses Manoel de Barros, Zeca Pagodinho, Zuenir Ventura, Mariza Monte, Oscar Niemeyer e milhares de outros, espalhados pelo mundo.

Onde quer que estejam, o poetinha Vinícius, Clarice Lispector e Glauber Rocha, também fazem a festa.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Cavalgando pela história


Duas horas da tarde de sexta-feira, 16.04. A caminho do Congresso, passando pela ponte sobre o Córrego do Torto, dirijo meu carro em meio a um movimento intenso de outros carros, ônibus e caminhões. Olho para o lado e vejo o contraste: no meio do mato, fora da estrada, um grupo de cavaleiros.

Brasília tem dessas coisas, penso comigo. Olho mais uma vez e percebo que estão todos uniformizados. Lembro então de ter visto na TV uma cavalgada organizada em homenagem ao cinquentenário de Brasília.

São eles. Reduzo a velocidade. Encontro um espaço para estacionar, depois da ponte. Subo na mureta e começo a fotografar.

Como uma coincidência fantástica, eles constatam que não há caminho no mato para transpor o córrego. O jeito é subir para a ponte. Bem onde eu havia parado. Um a um, depois de alcançar a estrada, eles passam por mim e acenam, ao perceber que estou fotografando.


Confesso ter ficado emocionado. O último deles pára e fala comigo. É Carlos Oscar Niemeyer, neto do arquiteto e idealizador do projeto Cavalgada Cultural. Estabelece-se então um papo rápido:

Como estão vocês? (Eu pergunto.)
Bem e emocionados por chegar em Brasília, quase trinta dias depois de ter deixado Belo Horizonte.

O que vai ficar na memória? (Pergunto de novo)
O carinho das pessoas humildes, nos lugares por onde passamos. A alegria das crianças ao receber os livros que estamos trazendo. E pisar no solo desta cidade, cinquenta anos depois dela ter saído da prancha de desenho do meu avô.

Carlos me diz que os 16 cavaleiros vão pernoitar na granja do Torto. No dia 21, eles encerram a cavalgada na Praça dos Três Poderes. É parte da festa real. A que nenhum escândalo apaga. Ele se despede e se junta aos outros.

Cavaleiros obstinados, gente simples, brasileiros. Que tragam nos alforges mais do que livros, mais que cultura. Que tenham um pouco de esperança, também. A esperança que não nos pode faltar. Nunca.

Marketing e eleições 2

Para quem não conseguiu assistir, na TV Brasil, a reportagem sobre internet e eleições, aí vai o link.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

A tormenta que virou esperança

O ponto de encontro entre os Oceanos Índico e Atlântico era conhecido no século 15 como Cabo das Tormentas, até que o navegador português Bartolomeu Dias conseguiu, em 1488 contorná-lo pela primeira vez.

Guardadas todas as proporções, vencer o Cabo das Tormentas foi um feito equivalente à chegada do homem à lua. Era a prova real que tornava possível ir do Ocidente ao Oriente, através do mar.


O fato é tão significativo para a história das navegações que está retratado em um painel do artista plástico Domingos Rabelo, na sede do Parlamento Português (reprodução do painel, aí acima).

A partir do dia em que foi transposto, o Cabo das Tormentas foi rebatizado e virou “Cabo da Boa Esperança”.

Ele fica a 50 KM da Cidade do Cabo, no Parque Nacional da Península do Cabo, na África do Sul. Cabo é o nome que se dá a um acidente geográfico, uma porção do continente que avança pelo mar.


Geologicamente, a península do Cabo faz parte da Table Mountains e sustenta o farol que é considerado o mais brilhante do mundo.

Pois, é de lá, do Cabo da Boa Esperança, que o meu maestro soberano, Luiz Theodoro, me manda essa foto postada aí abaixo. Lula foi inspirar-se na nossa mãe África. Ele promete mandar mais notícias de lá. E, certamente, a gente pode esperar uma nova e boa safra de músicas, também.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Marketing e eleições


Hoje de manhã, fui entrevistado pela TV Brasil. O assunto: Marketing político, internet e eleições. Foi um papo rápido, mas bastante interessante. Aos amigos que quiserem conferir, a reportagem será veiculada hoje mesmo, no "Repórter Brasil", a partir das nove da noite.

Se não der pra ver na TV, a informação que tenho é que o material vai em seguida para o portal da TV, na internet. Na pauta da conversa, o crescimento dos acessos à internet entre os brasileiros; os efeitos possíveis pela utilização da ferramenta na próxima eleição e os candidatos que já estão na frente, na corrida virtual pelo voto.

Sobre o olhar feminino


Maranhão (my friend,)

Tenho lido seus textos. Às vezes me emociono e em outras sinto que a veia jornalistica é indiscutível pelo estilo meio mordaz, meio singelo (depende do humor). Este texto, especialmente, (sobre o olhar de fotógrafa) foi bem bonito. Parabéns.

Por falta de tempo e paciencia não consegui me tornar sua "seguidora" no blog.
Quando eu voltar da África, terei mais tempo para fazer as coisas simples, que hoje me parecem montanhas intransponíveis.

Um grande abraço prá vc, minha querida amiga Mara e as crianças.
Bjão
Suzi

Suzi Huff Theodoro
Geóloga da Petrobras, pesquisadora adjunta sênior da UnB e PhD em gestão ambiental e desenvolvimento sustentável.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Olhar de fotógrafa


O teu olhar
Em direção ao céu
Não me deixa ver outra luz
que não a dos teus olhos

O branco infinito
O negro eterno
A vastidão dos sentidos
A fugir como um gesto

Estranha dança na noite
abismo / açoite / a sorte
de não ser mais do que é
ébano

Entre a noite e a escuridão
restou-me a luz
no branco
dos teus olhos


Poesia de Maranhão Viegas, para foto de Jane Franco
(inaugurando o olhar feminino, olhar de fotógrafa, neste blog)

Moleque bom!


Maurilo Andreas (assim mesmo, como ele sempre diz, Maurilo) é um moleque sangue bom, com quem trabalhei em Minas Gerais. Primeiro, nos cruzamos em BH. Numa tarde de criação, na Casca de Noz. O trabalho rendeu pouco. Mas o que rendeu mesmo, nossa amizade, parece que vai longe. Depois, tivemos uma curta - e definitiva - temporada de campanha política, em Montes Claros.

Ele é o cara do Pastelzinho. Um blog que compara a vida a um pastel: estranha por fora e recheada de coisas esquisitas. É lá no blog que ele faz - na minha modesta opinião - alguns dos seus melhores experimentos literários. Suas brincadeiras sérias. Suas molecagens desmedidas.

Brincando com letras, ele nos faz pensar. Suas linhas já revelaram ao mundo Sofia, sua filhota, que é linda e tem uma fórmula, também moleca, de fazê-lo fugir do mau humor.

Maurilo é dono do belo texto aí abaixo. Uma reflexão sobre a arte de convencer através da publicidade. É um texto crítico, mordaz e autêntico. Um insight publicitário-autofágico. Desses que a gente custa a encontrar neste mar de superficialidade.

Vou postar um pedaço do texto aqui. Se achar que eu tenho alguma razão, vá atrás do final, lá no pastelzinho. Acho que você vai curtir.

Todo aquele desejo que eu inventei para você

Charles Barkley foi, na minha opinião, um dos 50 melhores jogadores de basquete de todos os tempos. Além disso, "Sir" Charles é uma peça rara e autor de dezenas de frases espirituosas que serviriam para encher um livro.

Para mim, foi ele quem disse a frase definitiva sobre propaganda e as ilusões que ela cria.

"These are my new shoes. They're good shoes. They won't make you rich like me, they won't make you rebound like me, they definitely won't make you handsome like me. They'll only make you have shoes like me. That's it."

Eu ainda gosto muito de trabalhar com publicidade. É uma daquelas áreas que te permite olhar as coisas por ângulos diferentes, buscar o inusitado ao invés da norma e, principalemnte, não trabalhar de terno. Pelo menos na teoria é assim.

No entanto, eu tenho cada vez mais restrições ao papel da publicidade na sociedade: nós criamos ilusões. Talvez por isso a nova era da comunicação que parece surgir me alivie tanto. Me parece mais "moralmente" correto dialogar com quem tentamos convencer do que iludir a quem tentamos convencer.

Na maior parte do tempo nós não alimentamos o consumidor de informações, não colaboramos com o consumo consciente e nem melhoramos as novas gerações. Pelo menos não de maneira consistente ou remotamente regular. São raríssimos os momentos em que podemos pensar menos no truque e mais no espectador.

Nós vendemos ilusões.


Gostou?? Então curta o final do texto aqui.

domingo, 11 de abril de 2010

Olhar de fotógrafo


O laçador

As terras do meio oeste do Brasil compreendem campo e pantanal. É uma imensidão. Uma vastidão de terra que os olhos não se cansam de olhar. Por vezes, essas terras se dividem. Há o espaço dos homens e dos animais. Por vezes, eles coexistem e constroem uma linha incerta, anterior ao horizonte.

Às vezes, alguém com sensibilidade para o raro enxerga esses momentos e trata de eternizá-los. Como fez o fotógrafo Luiz Andrade, na foto aí de cima. (Confira, na sequência, o portfólio dele)

João e Santiago: uma tragédia revelada


Márcia Braga*

O documentário "Santiago" (2006), dirigido por João Moreira Salles, não é um filme sobre os limites entre o documental e a ficção, embora no início pareça encaminhar-se para essa direção. Ao revelar aspectos da história de vida de um homem que foi mordomo de sua família durante 30 anos, João Moreira cria uma espécie surpreendente de espelhamento particular, porque vai ver-se através de seu personagem.

Tudo que exprimimos através da linguagem vem do domínio do pensamento, e em toda tragédia há os momentos do nó e do desenlace. Mas como apresentar o que é falso? É Aristóteles, em Arte Poética, mais uma vez quem explica como age o nosso pensamento: "... quando uma coisa é, e outra coisa tambem é, ou, produzindo-se tal fato, tal outro igualmente se produz, se o segundo é real, o primeiro também o é ou se torna real", e para ele, aí estaria estabelecido o falso. Se temos um antecedente falso (e ele deve existir), se o antecedente for verdadeiro estabelece-se uma relação entre eles, porque o nosso pensamento saberia ser o segundo caso verdadeiro. Nós tiraríamos a falsa conclusão de que o primeiro também é.

E em "Santiago", o falso e o verdadeiro transformam a narrativa em tragédia. Se toda narração é uma sequência temporal, ou seja, há o tempo do narrador e o da narração, também existem o tempo do significado e o tempo do significante. E a relação de João Moreira com o seu mordomo, ou ex-mordomo (o que torna a situação ainda mais trágica), é uma relação de dominação. Embora Santiago já tivesse abandonado os domínios domésticos de sua família, no imaginário ele ainda era o dominado. A cena em que Santiago fala de flores e arranjos de frente para uma parede permanece inexplicável até para o próprio João.

O filme retoma a cartilha do cineasta japonês Yasujiro Ozu (1903/1963): uma câmera precisa e austera. E, apropriadamente, João Moreira insere a última cena do filme "Viagem a Tóquio", de Ozu, em que uma personagem pergunta à outra se a vida é uma decepção, e ela sorri, consentindo.

"Santiago" não é apenas a tragédia do protagonista, mas, principalmente, a de seu diretor. Um momento corajoso de João Moreira ao expor suas limitações, a consciência de que nada mais pode ser feito, já que Santiago se foi. É como se nos dissesse: olhem o que eu não fui capaz de perceber. Talvez, editar e exibir o filme seja uma forma de expiação.

"... as ameaças e as guerras/ havemos de atravessá-las/ rompê-las ao meio/ cortando-as/ como uma quilha corta/ as ondas...", disse uma vez Maiakóvski.

*Marcia Braga é jornalista e professora do curso de Jornalismo da FUNORTE, em Montes Claros, Minas Gerais. Sua auto-definição é um poema: "Meia dúzia de palavras sobre a minha origem: sou mineira de BH, jornalista e artesã, de palavras e objetos".

O fim de um drama e o início de outro



Entre os mistérios que a certeza da morte traz consigo está a impossibilidade de definir quanto tempo durará a dor de uma perda. Desde ontem, a dor da certeza deu fim e início a uma nova etapa na vida de seis mães de Luziânia, GO, cujos filhos estavam desaparecidos desde o início do ano.

A polícia anunciou que prendeu o criminoso. Ele é alguém que já esteve preso por um crime sexual. E por essas coisas que a lei não explica, foi solto. E uma semana depois de solto, deu provas de que era uma figura irrecuperável, um pária. Sequestrou e matou seis meninos, em uma sequência trágica e monstruosa.

Um serial killer, desses que a gente está mais acostumado a ver em filmes americanos, travestido de pedreiro. Estranha forma de ser. Uma mente desvirtuada que entrou sem ser chamada na vida de mães humildes, para interromper o futuro dos seus filhos. Para interromper a vida. Não me passa pela cabeça um tipo de sentença capaz de punir esse crime.

Cabe apenas desejar que essas mulheres, na sua simplicidade, encontrem força e equilíbrio para resistir a tamanha dor. E que elas não deixem o fogo da vingança tomar-lhe a alma.

sábado, 10 de abril de 2010

Tempo, tempo, tempo, tempo...


Elton Scartazini é um velho companheiro dos tempos de faculdade, a UNISINOS, em São Leopoldo - RS. Nesse período, vivemos sob o mesmo teto em uma casa que, de tão simples, nem era reconhecida pelo correio. Não havia número, não havia identidade. Até que um dia, cansados de tanta ausência, pintamos na parede branca, ao lado da porta, uma inscrição que passou a ser a nossa forma de dizer ao mundo – e aos carteiros – que a casa existia, sim: “344 da nossa imaginação”.

Depois desse dia, dava orgulho preencher qualquer formulário de endereço. 344 da nossa imaginação. As pessoas olhavam espantadas e não entendiam muito, mas, pelo bem ou pelo mal, passamos a receber correspondências. E os carteiros passaram a nos respeitar.

Nossa casa era um território livre. Para tudo e para todos. Uma pequena sala, um quarto com duas camas e um armário. Um banheiro e uma cozinha. A parede, cheia de poesia e uma desordem natural dos tempos de escola. O resto era por conta da necessidade. Foi lá, no 344 da nossa imaginação, que muitos dos nossos planos universitários nasceram também. As reuniões para tomar o diretório acadêmico. A formação de um grupo político. As discussões sobre semiótica e semiologia. As rotas de viagem...

Aliás, lá no 344 da nossa imaginação planejei, durante mais de seis meses, uma viagem com o “alemão” – apesar da descendência italiana, era assim que chamávamos o Elton. Seria uma viagem de mochileiros, num tempo em que o regime militar ainda prevalescia na Argentina. Pensamos no roteiro, nos dois meses que duraria a aventura, no que precisaríamos fazer para sobreviver entre os “hermanos”.

A três dias da viagem, conheci Mara. E no mesmo dia, sem que eu me desse conta, o meu endereço mudou. Foi o que a literatura chama de amor à primeira vista. Foi mais. Foi o início não planejado de outra longa aventura.

No dia marcado para a nossa partida o Alemão foi até onde eu estava, no apartamento da Mara. Abri a porta e ele lá, de mochila nas costas, me perguntou: E então, vamos? Olhei firme para ele, dei-lhe um abraço e desejei boa viagem. Eu havia começado outra. Mais longa que o pampa argentino. Mais vigorosa do que eu poderia prever.

Nossa amizade sobreviveu à mudança de planos e o meu encontro com a Mara durou mesmo mais do que fosse possível prever. O Alemão escolheu certo ao seguir viagem. E eu também, ao escolher a caminhada com a Mara.



Hoje o Elton vive em Brasília e nos encontramos com alguma frequência. Ele é uma espécie de agitador cultural, revolucionário dos costumes, um alemão à frente do seu tempo lá pelas bandas de Samambaia. Construiu uma bela casa que abriga, além dos filhos e da companheira, um escritório de jornalismo e um ateliê onde cria suas obras de arte. O alemão nunca deixou de ser artista e não cabe em qualquer rotulagem. É artista. Só.



Foi visitando a casa dele e revendo os seus arquivos que encontrei esse recorte de jornal (postado lá em cima), dando notícia do lançamento do livro “Sinal Algum”, nossa primeira incursão literária. Dos que aparecem na foto, o Ronald já não está mais com a gente.

O Edson está na Bahia. Das meninas, Mariane e Eliane Manfroi, não tenho notícia. O Ronaldo, está em algum lugar do Rio Grande do Sul e o Gilmar Rodrigues é roteirista de televisão e escritor. Vive no Rio de Janeiro e acaba de lançar um livro “Loucas de amor”, que vai merecer uma postagem especial em alguns dias.

“Sinal Algum” teve vida breve. Marcou o início da carreira de um bando de guris ousados. E vendeu toda a tiragem. Eu tenho uns exemplares, o Alemão tem dois. O livro reunia contos, crônicas e poesia. E, relendo hoje, não faz feio. Também resistiu ao tempo.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Entre a ave e a Cruz


Foto: Planalto Central, 1957. Risco inicial do traçado de Brasília. Fonte da imagem: Livro Lucio Costa o inventor da cidade de Brasília. Crédito Casa Lucio Costa.

Há muito mais do que se pode enxergar na disputa indireta marcada para o dia 17 de abril, quando será eleito o governador do Distrito Federal que irá cumprir um mandato tampão até dezembro deste ano.

A situação, em si, já é inédita. Nunca houve na história recente do país uma sucessão de acontecimentos como a que se vive em Brasília. Um escândalo fartamente documentado em vídeos de boa qualidade, quase profissionais, deu a partida na crise.
Foi a ponta de um iceberg. Para baixo da linha do mar, uma profusão de atitudes ilegais, imorais e ilícitas. Constatou-se aos poucos o que o Procurador Geral da República classificou como “uma metástase” nos poderes Executivo e Legislativo. Até hoje, não se sabe onde vai parar a ponta desse novelo que começou a ser esticada em novembro do ano passado.

De lá pra cá, o que se viu foi um desmonte. Desmontou-se o governo. O governador e alguns dos seus principais auxiliares foram parar atrás das grades. A força da lei atingiu em cheio também a Câmara Distrital. Provocou a renúncia de dois deputados; um foi para a cadeia, vários outros foram enxovalhados publicamente, pela exibição exaustiva de imagens em que embolsam dinheiro suspeito.

Em quinze dias, o Distrito Federal teve três governadores. O eleito foi preso e afastado; o vice- governador, tentou assumir, mas foi defenestrado por conta das denúncias que também o alcançaram. Sobrou para o presidente da Câmara Distrital. Ele está lá. Um deputado de primeira viagem, sem nenhuma experiência administrativa e, pelo seus primeiros atos administrativos, sem inspirar a mais mínima confiança.

Junto com tudo isso, desmontou-se a esperança de comemorar os cinquenta anos de fundação da cidade. A Capital Federal, sonhada e construída sob o comando de Juscelino, está triste e abalada. Não há espaço para comemorações. O escândalo político golpeou de morte a alegria do cinquentenário.

O que se comemora agora é a chegada do dia seguinte, sem intervenção federal. Quer dizer, o que alguns comemoram, não todos. Os que acham que a intervenção federal é um golpe na autonomia se debatem para evitá-la. Buscam forças para sustentar instituições combalidas. Mas o esforço se mostra, por vezes, inútil quando um olhar mais cuidadoso e detalhista recai sobre os políticos que lá estão, incumbidos de promover uma mudança de rumos. É como tentar segurar com as mãos um pedaço de gelatina. Contém-se de um lado, mas escapa do outro.

Os que acham que a intervenção federal é um mal necessário lembram que o recurso está previsto na Constituição. É portanto um meio legal, legítimo, ainda que muito duro, de dizer basta a tanto desmando e a tanta corrupção. Como se diria no interior, um freio de arrumação.

O tempo é curto e passa rápido. No dia de hoje, 07 de abril, encerra-se o prazo para inscrições de candidaturas à eleição indireta. Especula-se muito, articula-se mais. Mas nada do que se viu até aqui atende aos critérios elementares, que podem reconduzir à tranquilidade dos dias e à segurança administrativa.

Por um motivo ou outro, há sempre uma ressalva aos nomes que surgiram até aqui. Um tem as marcas da ligação estreita com velhos coronéis. Outro, tem o DNA dos novos coronéis. Outro ainda, não tem marcas, é indecifrável. O fato é que sobressaem as “qualidades” negativas dos candidatos já postos. Os defeitos se mostram maiores que as virtudes em cada um deles. E isso cerca de suspeita a capacidade de fazer um governo sério, ainda que seja só um governo tampão.

Justo a cidade do país onde se concentra o maior número de políticos por metro quadrado, não consegue encontrar um que sirva para lhe salvar do caos. É uma contradição, uma dura e triste contradição.

Sobram dúvidas. Mingua a esperança. Exatamente por isso, o olhar cauteloso do último poder que ainda se mantém vigilante, o Judiciário, será decisivo para orientar o futuro. Um passo em falso nesta eleição indireta será a senha para uma intervenção federal.

Abril será um mês definitivo na história de Brasília. No dia 17, uma eleição indireta para um governo tampão. No dia 21, o cinquentenário da cidade. Talvez, nesse dia, a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o pedido de intervenção. E é dessa decisão que se saberá como o Judiciário entendeu o movimento do Legislativo e do Executivo.

Qualquer que seja o resultado, o traço de Brasília será outro, distinto daquele que surgiu à prancha de Lúcio e Niemeyer. Talvez, uma bela ave, cheia de leveza em suas asas, apontando para um longo e promissor vôo. Talvez uma cruz, cujo peso só será suportado se for repartido entre todos, ilustres e simples mortais. Sem excessão.

sábado, 3 de abril de 2010

Pudim de leite!


Quinta-feira à noite, fui dar um beijo em minha mãe, dona Isabel. Ela estava toda faceira. Havia comprado óculos novos. Um não. Dois. Segundo ela: um feio, pra usar em casa. Outro, bonito, pra impressionar nas suas saídas. Na minha opinião, os dois são bonitos. Não fiz distinção.

Por falar nisso, há algo que me remete à minha mãe, onde quer que eu esteja no mundo. O pudim de leite que ela faz. Não tem igual. E pra mim, tem um sabor especial. Como fui o primeiro a sair de casa e cair no mundo, toda vez que eu voltei, encontrei um pudim prontinho na geladeira.

Para o meu deleite. E pra matar de inveja os meus irmãos. Pudim de leite, na casa de dona Isabel, tem dono sim, senhor. Ninguém tasca, eu vi primeiro.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Vovô é doido!


Innocêncio Viégas

Além da esposa e dos filhos, todos nós temos outra paixão por alguma coisa.
Quando menino, nos meus seis ou sete anos, eu ficava horas olhando o meu pai amolar as suas ferramentas. A mamãe me dizia que o velho, quando estava preocupado com algo, ou triste, ou mesmo zangado com algum dos seus trabalhadores, pegava suas facas, machado, facão e até a velha enxada e ia para o fundo do quintal onde havia a “pedra de amolar” e ficava um bom tempo a amolar, amolar e eu lá olhando e fazendo as perguntas que todo menino faz ao pai. Por quê?

Aqueles momentos ficaram gravados em mim.São as minhas ricas lembranças. Cresci, me fiz jovem, rapaz e homem maduro. Agora sou um idoso vivendo os bons momentos da terceira idade, amolando também as minhas imaginárias ferramentas enquanto chega a quarta idade, se é que ainda vai ser criada.

Certo dia – vagamundeando – encontrei em uma banca de revista, um exemplar da revista Magnum, falando sobre facas. Logo adquiri a revista e fui correndo para casa “degustar” com os olhos, aquela preciosidade.

Era o ano de 1990 e a revista endeusava a faca Bowie por ser ela a mais famosa de todas as facas. Folheando gostosamente a revista, entre mil facas encontrei a faca dos meus sonhos: uma Zakharov. Ela é criação do russo Piotr Zakharov que se naturalizou brasileiro. Essa faca é de uso quase obrigatório em vários países, nas forças armadas e nas policias. São caras, e isso me impediu de comprá-la.

Um belo dia, voltando para casa, a Bel, pelo celular, pede que eu compre um saco de adubo para as nossas plantas.

Antes de entrar no “Pólo Verde”, local de revenda de plantas, adubos e tudo para jardinagem, vi uma tenda com uma faixa que dizia: Cutelaria. Pronto, a faca apareceu logo em minha mente e vi papai amolando as suas ferramentas.

Adubo comprado, fui à tenda. Dezenas de belas facas e cutelos de todas as qualidades.
Logo perguntei pela Zakharov. O vendedor, um senhor de meia idade, bem disposto e alegre levou-me ao outro compartimento da tenda e lá estavam as “dondocas” enfileiradas e atraentes. Ele passou a descrever nomes, tamanhos e utilidades de cada uma delas.

Apaixonado por todas, “gamei” na tradicional, uma faca de quase dez polegadas de lâmina. O preço? Ah! O preço, a ninharia de duzentos e oitenta e cinco reais. Paguei com dois cheques, peguei a bonitona e sai com o meu presente de aniversário dos meus setenta e três anos.

No primeiro domingo, com os filhos e boa parte dos netos em casa, fui inaugurar a faca em uma gorda picanha. Parecia que eu estava cortando um tablete de manteiga. Uma sensação gostosa. Não me contive e fui mostrar à Bel, aos filhos, noras , genro e netos. O Isanor, com o Dudu no colo, achou linda e perguntou o preço. Falei baixinho para a Bel não ouvir senão a briga seria feia e a faca poderia até perder o “fio”.

Isanor repetiu o valor, bem alto, com toda admiração. Todos ficaram curiosos. A Paulinha se admirou tanto com o custo que eu tremi. A turquinha Andréa arregalou os olhos e ficou sem palavras, achando muito cara.

Diante de tanta admiração pela faca e o espanto pelo preço, o netinho Dudu,nos seus quase dois anos, sorrindo, falou: Vovô é doido!

Todos riram. O pai lhe repreendeu. A Bel veio saber o que acontecia e viu a faca e também gostou e não brigou comigo. Fui salvo pela sabedoria oportuna do Dudu. Em vista disso tudo, faço desta crônica o meu testamento para dizer que esta faca Zakharov tradicional – C – 56869, de nove polegadas e três quartos de lâmina, será destinada ao Dudu, quando do meu passamento, a critério dos seus pais e na idade devida para usar facas.

Passado o susto, fui degustar um bom vinho e fazer os meus bifes gordos e sangrando o suco vermelho da gostosura. Só aí pude concordar com o meu netinho Dudu, que na sua inocência e diante de tanto espanto, sentenciou o que todos da família já sabem... Vovô é doido! E eu acrescentaria: Doido por vinho, por uma gorda picanha e por faca Zakharov!

Innocêncio Viégas é meu pai. E é escritor – Teólogo - Membro da Academia de Letras de Brasília. Ele resolveu inaugurar assim, com esse texto, a visita ao meu blog. E a partir de agora, pode fazer isso sempre que quiser, do jeito que quiser. Será sempre uma honra pra mim. Além do mais, como eu aprendi a dizer lá em casa, depois que o meu pai se formou em teologia: "o senhor é meu pastor..." A Bel, que ele fala no texto, é a companheira dele por quase 50 anos. E minha mãe.
Email: ijviegas@bol.com.br

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Quinta-feira santa


Da varanda de minha casa, vejo Brasília amanhecer assim.
Dizem por aqui que o lugar onde moro, Sobradinho, é a Petrópolis do cerrado. Olhando a foto, sou obrigado a creditar que há certa razão nisso.

Essa bruma que entremeia a copa das árvores nos deixa mais perto do céu e com um arzinho de serra. Quem não conhece o lugar, dificilmente compreenderá, mas isto também é Brasília.

E eu agradeço, todos os dias, por essa visão que nos livra de todo o mal e nos devolve o dia cheio de poesia.