terça-feira, 20 de abril de 2010

Declaração de amor por Brasília


foto: Alessandro Dantas

Caro amigo Maranhão,

Em falta de boas notícias do Rio de Janeiro, lembro-me de colaborar com o Blog do Maranhão e busco na poeira dos arquivos um poema que escrevi há 10 anos, no curto período em que morei em Brasília.

É cidade (lugar? maquete? ficção?) que amo e que povoa minha imaginação desde muito criança, quando ainda não acreditava que aquela maravilha modernista cujas fotos eu via nos calendários existisse no brasil.

Pois morei aí, na condição típica de servidor federal em treinamento, em 2000. Caminhava pelos gramados do eixão, por baixo dos blocos, da sudoeste até a rodoviária, via gente e coisas triviais, e voltava...

Era o que sempre quis fazer, desde quando passava rapidamente pela cidade no trajeto improvável Calvador-Campo Grande... desde quando em Brasília não havia semáforos, muito menos engarrafamentos...

Umas 20 e tantas vezes passei por Brasília, apenas uma vez morei nela, e só o que tenho para ela em seu aniversário é um poema empoeirado, que nasceu nela, de seu pó e sua luz.

Pensei que talvez você pudesse publicá-lo no blog, o que muito me honraria.

Segue aí poesia:

A nave em corpo de ave
deita as asas duras no solo infértil
feito sombra, feito pele
feita à mão desde o alto
para ainda acima ser notado seu gesto imperioso.

O barro de muitas mãos,
o pó sobre muitas vontades
se transmutaram em palácios para as torres mais altas
altares para todo sacrifício
muros invisíveis contra toda rebeldia.

E o mar imenso despencou das nuvens
em véu suspenso nas arestas ideais.

A língua tímida do lago lambe e consola
a proa a prumo do horizonte veloz.

Planos eixos plataformas no centro deserto
fazem girar arraial satélites nação
em torno do umbigo sagrado da aldeia
asas retas orgulhosas coladas ao cru do chão
em asfáltica oferenda

Dança metálica
lavoura de pedra a romper o sertão
de onde só as vê e se vê nelas quem
sabe seu lugar no ritual perpétuo
cometido ao espanto e deleite dos deuses.


Angelo de Souza é jornalista, vive no Rio de Janeiro, apesar de ter o coração espalhado por vários pedaços desse imenso Brasil. Tem green card no blog. Pro que der e vier.

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