sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010
Ventania
A estatura física do Mauro di Deus não traduz a dimensão da personalidade dele. A relação é inversamente proporcional. O baixinho Mauro tem uma personalidade gigante. Eu o conheço há muito, desde o Mato Grosso do Sul. Quem nos apresentou foi Maristela Yule. E quis o destino que ficássemos mais próximos aqui em Brasília.
Nas conversas desavisadas que temos vamos descobrindo amigos comuns, construindo outras amizades e, sobretudo, fazendo poesia com o que a vida nos dá em forma de cotidiano. A política está sempre em pauta, como só haveria de ser. Ele e eu nos encontramos sempre aqui no Congresso, onde trabalhamos.
Mas em nossas conversas cabe tudo. Cinema, música, filhos. Como eu, o Mauro é um apaixonado pela vida. Já percebi que uma das paixões dele é o Congresso Nacional. A Instituição, seus habitantes e sua história. Pois, foi numa conversa de hoje à tarde que ele me saiu com uma historinha genial sobre a construção de uma parte do prédio do Congresso.
Me disse ele que lá por volta de 61/62, quando o Brasil experimentava um curto período de parlamentarismo, Niemeyer foi chamado às pressas para construir mais um bloco, colado ao prédio principal do Congresso Nacional, que hoje abriga a presidência da casa.
O limite do prédio original terminava na parede oposta ao Salão Verde. Projeto feito, a parede derrubada deu lugar a um fosso de luz e um jardim. Para cobrir a parede do novo bloco foi convocado, também às pressas, o artista plástico Athos Bulcão, carioca que adotou Brasília e era considerado um “compositor de espaços”. Por onde se anda, em Brasília, há a presença do forte traço dele, seja nos cubos do teatro Nacional ou nos azulejos de desenhos peculiares.
Athos fez o projeto dos azulejos. Eles foram produzidos e entregues para a colocação. O engenheiro responsável pela obra cobrou um diagrama de montagem do painel. Não havia. A solução foi falar com ao autor, mas Athos estava na Europa. E o prazo de entrega da obra estava no fim. Numa época em que não havia internet e as comunicações se davam de forma mais complexa e demorada, foram necessários três dias até contatá-lo.
Cobrado, ele responde: não há diagrama. Perplexo, do outro lado da linha o engenheiro perguntou como fazer para montar a peça. Athos não teve dúvidas: Pergunte aos seus pedreiros quais não sabem ler e entregue a eles a tarefa de montar o painel.
O resultado é uma obra que se chama “ventania”, dá vida e luz ao Salão Verde do Congresso Nacional. Feita por um artista excepcional e por homens iletrados, mas cheios de sensibilidade.
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ge-ni-al! isso -- a arte analfabeta acima de toda planificação -- é o que humaniza brasília, vinga os vaqueiros voadores sepultados no concreto da obra feita a toque-de-caixa, redime a todos nós dessas vergonhas-arruda, vergonhas-roriz etc. abç
ResponderExcluirEntão... essa "ventania", além de linda, tem uma história que se confunde com a criatividade e competência de nosso povo!!
ResponderExcluirIsso tinha que ser divulgado pro mundo...
Trata-se de algo muito mais interessante, por exemplo, do que aquele manequinho sem graça lá da Bélgica, que todo mundo tem que ir conhecer..
Todos nós buscamos o belo e quanto mais primitivos somos, digo, sem intervenção externa, tanto melhor...
ResponderExcluirA arte pura vem da falta do que comparar, por isso é cada vez mais difícil um artista original, genuíno.
Lindo isso...muito bom saber dessas histórias!
Fantática história!!!A arte é apenas sentimentos...
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