sábado, 18 de agosto de 2012

Para Mara, sobre Margot



Enviado via iPad

Meu bem. Ainda não assimilei direito a passagem da Margot. Fiquei meio anestesiado desde o momento da ligação da Ecilda. Para mim não foi surpresa. Foi só a dor de saber que ela se foi mesmo. Em definitivo.

Da ultima vez que falamos, você já tinha percebido, fiquei com a impressão de que estávamos perdendo a Margot. Ela tinha um fiapinho de voz. Coisa de quem estava encerrando uma etapa. Coisa de quem não iria muito longe. Falando com ela ao telefone, fiquei com a impressão de uma despedida. Hoje, sei que aquele telefonema foi mesmo nossa despedida. E nos despedimos declarando o nosso amor, um pelo outro.

Eu queria ter estado com ela. Eu queria estar por perto hoje. Mas não deu. Quis o destino que a Mariana estivesse lá em nosso lugar. E eu aceito isso. Estaremos bem representados. Falei ontem ainda com a Mariana. Ela chorou um pouco. Mas estava firme. Foi até o local onde o corpo vai ser velado. Encontrou a Yuri Matsunaka na porta, que a informou que o velório só começaria hoje de manhã.

Mariana se identificou, disse que era nossa filha e a Yuri quis saber de nós. Nesse momento, Mariana é você, e eu, e Gabriel, e todos nós.

Não tive jeito de escrever nada além do que estou escrevendo agora, pra ti. Acordei varias vezes à noite e em todas, pensei na Margot. Passei a vida em revista. Do momento em que a conhecemos. Do dia em que ela nos salvou com a Mariana. Das vezes todas em que ela se fez presente e declarou o seu amor. De quando ela te aconselhou e me aconselhou. Do amor imenso que sinto por ela... Lembrei de muito.

Com ela vivi tudo o que podia. Tomei bons vinhos. Tive boas e definitivas conversas. Me indignei e me alegrei. Dividi outras perdas, de outros amigos. Comemorei vitórias. Com a Margot reparti sonhos, utopias, brinquei, chorei, gargalhei.

Daqui de onde estou, no Acre, sozinho neste quarto de hotel, vendo uma manhã nascer devagarinho e preguiçosa, escrevendo essas linhas poucas, faço a minha despedida em silêncio.

Do mesmo jeito que a natureza avisou a Mariana e a fez chorar sem saber porquê, no caminho do aeroporto, desse mesmo jeito, tenho a sensação de que, enquanto escrevo pra ti, Margot me lê também. E aceita com carinho essa minha mensagem.

Nada mais nos resta fazer, senão reter na memória a sabedoria e a delicadeza dessa mulher que entrou em nossas vidas para fazê-la melhor. Que nos ensinou a olhar o mundo de um jeito distinto, elegante, firme e respeitoso.

Margot carregou nas mãos um punhado de dignidade, a vida inteira. Quando lhe faltou respeito, ela tinha dignidade. Quando lhe faltou companhia, ela tinha dignidade. Quando lhe faltou dinheiro, ela tinha dignidade. Em Margot, a dignidade havia, de sobra.

E foi assim que ela nos deixou. Carregando nas mãos o seu punhado infinito de dignidade.

Sou hoje um pedaço incompleto do que já fui. Pelos dias que passaram, pelos amores que se foram, pelos amigos que seguiram rumo ao desconhecido. Nesse exato momento, pela falta, que sei, a Margot vai nos fazer.

E antes de seguir a vida, quero te dizer: mesmo à distância, estivestes aqui, comigo, me ajudando a encarar e suportar a tristeza dessa perda. Obrigado por caminhar comigo. Eu te amo.


Maranhão.

4 comentários:

  1. É tão cheia de energia essa identificação pelas palavras do outro. Eu conheci pouco a Margot, eu lembro pouco dela, mas lendo seu texto, senti a perda. A sua perda. Obrigada amigo, por escrever com tanta verdade, doçura e sentimento. Quando me emociono, eu sinto a vida tão forte em mim. Acho que é só isso que vale: sentir. E sentir que se vive profundamente. Porque nada mais ficará.

    ResponderExcluir
  2. Maranhão com a sabedoria que lhe é peculiar definiu a grande Margarida como dignidade. É isso mesmo que a diferencia dos seres banais que acham que digno é ter, ou fazer, e mal conseguem perceber que o SER digno é o bem maior; e isso ela exemplificou, na prática, como quase ninguém.

    ResponderExcluir
  3. Não conhecia a Margot de carne e osso, conhecia a Margot da fotografia com cabelos prateados, painas brilhantes e macias. Conhecia Margot de suas falas amorosas e cheias de admiração, a mulher que atravessou sua história cheia de verdade. Ela sabia do seu chão, das suas dores e alegrias, madrinha da Mariana, amiga da Mara e sua amiga.

    Não sei Margot sem você e por isso mesmo sei a dor que você está, assim, dói em mim também.

    Não faço nada com isso além de pensar em você e desejar que isso vire saudade logo. Só a saudade ameniza a dor. Saudade a gente tem do que é bom.

    ResponderExcluir
  4. de ler essa sua homenagem 'a nossa dignissima margarida (tao mais sua do que de outros como eu, distraidos na amizade, relaxados de pensar que certas pessoas vao estar sempre onde as vimos pela ultima vez), a dor aumenta, identificada com a de alguem tao proximo de quem agora ficou de repente tao distante. mas, com a dor, o consolo da certeza de que fomos privilegiados todos os que ela tocou com a ponta, o vento, a sombra da sua asa. choro com voce e com todos que a amam e seguirao amando. forte abraco, felicidade em familia e boa sorte no acre.

    ResponderExcluir