Família Di Quarto: Andrea, Eliane, Lorenzo e Sophia |
De Milão, na Itália, Eliane Di Quarto me escreve:
Maranhão!
Hoje
eu acordei pensando num taxista da
enorme e desvairada São Paulo de quem eu nem sei o nome. Pensei, ainda, no
Mineiro Louco. Um homem de quem eu mal sei o paradeiro. Imagine se sei onde mora! São brasileiros! Prontos a ajudar e, por
isto mesmo, ficaram na nossa memória. Fazem parte das nossas histórias de
aventuras.
Seguem os textos:
Julho
de 2001.
Eu tinha que passar no Consulado Italiano, em São Paulo, para retirar
o meu passaporte com o visto para a Itália. Cheguei logo cedo com passagem
comprada para embarcar para Milão às 19h do mesmo dia. Dia de greve de
transporte coletivo na Paulicéia. Trânsito um caos é dizer pouco. Minha amiga,
Rosangela Valente, me pegou no aeroporto pra me levar ao Consulado que fechava
na hora do almoço. Meio expediente. Morando em São Paulo há pouco tempo e pouco
prática com ruas, avenidas e endereços, não era otimista. “Ane, não sei se a
gente chega lá em tempo.” Trânsito praticamente parado.
Disparado, mesmo, só o
meu coração. Já estava saindo pela boca. Como poderia embarcar sem o meu
passaporte? Não poderia. Bem simples. A uma certa altura do campeonato, num
semáforo vermelho, vi um taxista ao nosso lado. Desci do carro da Rosangela e
disse a ela: "Te espero no Consulado. Quando você chegar, chegou."
Entrei no
táxi do homem e pedi a ele pra me levar. Só colocou a mão na cabeça com um
gesto preocupado e disse que não poderia porque ele estava transportando
valores para uma empresa. Se o pegassem ele perderia o trabalho. Eu expliquei
que poderia me abaixar no carro e ninguém me veria. Coisa de brasileira que dá
jeito pra tudo. Implorei, expliquei a
minha situação, contei a minha história. Falei que estava mudando de vida com
uma passagem de só ida, porém não poderia embarcar sem o documento. Faltavam 40
minutos para que o Consulado fechasse. Vendo a minha angústia ele só me disse:
“Tá bom, moça. Tá bom!!”
Chegamos ao Consulado com as portas quase fechando. Antes
de descer do carro dei 50 reais a ele. Era, na época, bem mais do que valia a
corrida. Não aceitou. Só me disse: “A senhora não me deve nada não. Vai em paz, pegue o seu documento e que Deus lhe
acompanhe. Boa sorte, tá?” Peguei o meu passaporte, saí do Consulado, sem olhar
pra trás, sentei no meio-fio e esperei a Rosangela. Nem perguntei o nome do taxista mas me lembro
muito bem da carinha magra dele. Se o encontrasse pelas ruas de São Paulo
talvez pudesse reconhecê-lo.
Outubro
de 2006.
Estávamos no Pantanal. Saímos de Corumbá e queríamos rumar para a
Pousada do Lontra. Um pit stop para o almoço antes de continuar para Campo
Grande. Eu, Andrea, meu marido, minha mãe e o Lorenzo; na época com apenas 2
anos. Viajávamos em um carro pequeno, baixo, e lá para os lados do Passo do
Lontra havia chovido muito. Próprio tanto!
De repente, nos vimos atolados com
barro que chegava para cima das canelas. Andrea, europeu, habituado a dirigir em “autostrada” sem nunca ter
atolado na vida dele, segurou a onda pra não demonstrar o nervoso, não
verbalizou mas vi o pânico nos olhos dele. Olhamos para o Lorenzo que já
começava a reclamar de fome. Em volta não havia nada.
Deste nada apareceu um
moço, vestido para a missa de domingo. Camisa clara impecavelmente passada,
jeans e botas pra lá de limpos. A fivela no cinto de couro reluzia. Ele chegou
perto, coçou a cabeça e disse: se alguém souber ficar no volante eu empurro e
tiro vocês daqui. Eu olhei para a roupa de domingo dele e senti pena. “Como é que você se chama?” E ele: "Todo
mundo me chama de Mineiro Louco. A senhora pode me chamar assim, também." Pois bem... “Mineiro louco, não é o caso de
você ficar no volante e eu e meu marido, que já estamos um pouco embarrados, empurrarmos?” Sei lá por quais motivos o
Mineiro não concordou com a minha idéia. Empurrou o carro, saímos do atoleiro e
ele com uma roupa tooooda respingada de barro.
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