Nico Nicolaiewsky era meu amigo. Ele
nem me conhecia. Mas era. Eu faço parte dos milhares de admiradores dele espalhados pelai. Ele nem
tinha como conhecer a todos, mas nós o conhecíamos muito
bem.
No meu caso, estava chegando
ao Rio Grande do Sul para fazer faculdade de jornalismo e a música que ele já
fazia, com o “Musical Saracura” me hipnotizava. Em 85, deixei o RS, mas Nico nunca mais saiu de perto dos meus
ouvidos e da minha alma. Depois, nos encontramos de novo, várias vezes. Por esse Brasilzão afora.
Ele no
palco, ao lado de Ique Gomes e na
pele do sborniano mais famoso do mundo,
no musical Tangos & Tragédias. E
eu na plateia. Anônimo, a admirá-lo à distância.
Nico jamais soube
uma vírgula a meu respeito. Mas ontem, quando li sobre a morte dele, senti uma
dor no peito como se tivesse sabido da morte de um amigo de infância. Desses com quem a
gente divide um banho de mar, uma confissão ou uma taça de vinho.
Repassei a história
dele com a ajuda de outros amigos virtuais, como o Márcio Grings, de Santa Maria, e o Arthur de Faria. O Arthur, aliás, merece ser lido em seus textos
sobre a música do RS. Sobre os seus amigos queridos e sobre a amizade dele
(essa sim, real) com o Nico.
Enquanto lia, vi a
minha vida de estudante passar como num filme Super 8 assinado por Giba Assis Brasil, Nelson Nadotti ou Carlos Gerbasi. Percorri o campus da
UNISINOS, as ruas de São Leo, o Bairro do Bonfim, em Porto Alegre, o Araújo Viana, o Ocidente e
o Bar João.
Meu exílio voluntário gaúcho me invadiu pelas entranhas como as manhãs de sol invadem o Gasômetro, à beira do Rio Guaíba. Me lembrei da primeira valsa emocionante que ouvi do Nico, “Feito um Picolé no Sol”, eu já estava fora das terras gaúchas, mas aquilo me transportou na hora para a Redenção.
Meu exílio voluntário gaúcho me invadiu pelas entranhas como as manhãs de sol invadem o Gasômetro, à beira do Rio Guaíba. Me lembrei da primeira valsa emocionante que ouvi do Nico, “Feito um Picolé no Sol”, eu já estava fora das terras gaúchas, mas aquilo me transportou na hora para a Redenção.
A música era poesia
também. Quem lê a letra viaja num poema feito de um fôlego só. De novo recorri
à internet e achei um filme do Nico cantando essa música, numa apresentação do
ano passado, na reinauguração do Teatro Araújo Viana, em Porto Alegre. A
gravação está meio tremida, mas vale a pena pela música e pelo Nico.
Flor é outra das muitas poesias musicadas pelo Nico
que viraram clássico. O texto é curto. O contexto é mágico. A beleza, infinita.
Flor que desabrocha no sertão
Tem que ser toda como areia
Que vive ao seu redor
Constante sol
Ou então vai ser mais uma só
Mais uma só...
Mais uma só...
Tem que ser toda como areia
Que vive ao seu redor
Constante sol
Ou então vai ser mais uma só
Mais uma só...
Mais uma só...
Nico, Ique e o
espetáculo Tangos & Tragédias
ganharam o Brasil e o mundo. A fórmula que nasceu como uma brincadeira virou um
dos mais respeitados e divertidos espetáculos da cultura gaúcha. Uma mistura
fina de humor, poesia e música de qualidade.
Depois de um tempo, tornou-se uma
tradição entre os gaúchos, principalmente os de Porto Alegre – não terminar um
ano sem ver pelo menos uma apresentação de Tangos & Tragédias, no teatro
São Pedro. E foram muitos anos, e muitos espetáculos, e milhares de
espectadores, habituados a encerrar o show seguindo os dois músicos do teatro
até o fim apoteótico na Praça da Matriz.
Mais recentemente,
Nico montou um show, Música de Camelô, com releituras de sucessos populares. Música de câmara,
para piano e voz, feita a partir de canções que despertam amor e ódio em suas versões
originais.
Bingo! O maestro acertou de novo. E é simples entender porque assistindo versões nicolaiewskyanas para Los Hermanos, Michel Teló e João Lucas e Marcelo.
Bingo! O maestro acertou de novo. E é simples entender porque assistindo versões nicolaiewskyanas para Los Hermanos, Michel Teló e João Lucas e Marcelo.
Ontem, a poesia
perdeu um pouco de cor. Nico nos deixa a todos um pouco mais órfãos. De sua leveza musical, de um estilo despojado
de enfrentar a vida e de um cada vez mais raro humor refinado. Sai de cena para
virar um risco no céu (lembrando um outro poeta da música gaúcha que também
partiu cedo, Carlinhos Hartlieb). A
saudade já bate forte. Vida que segue, voando.
Obrigada, por me apresentar o Niko apesar de tarde. Não, nada é tarde quando se tem uma memória fresca. A música dele me remete a algum lugar perdido que não sei em que canto está. Essa musica Flor, tem um cheiro que sai da terra molhada! Simplesmente linda!
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