sexta-feira, 26 de julho de 2019

O minimalismo da esfera de Magó


O público ocupa o palco. Uma roda de espectadores se forma diante de um pequeno círculo. A gema do palco/ovo/célula. Dentro dele, nada. O silêncio e o escuro. O que virá dali é uma incógnita. 

Um facho de luz se acende e revela um pêndulo cuja ponta é uma esfera perfeita. O escuro do ambiente cria a ilusão de aproximação. O silêncio é provocador. Cá embaixo, a pequena plateia se mexe nas cadeiras. Olhares voltados pra cima, pro alto. O silêncio e a semiescuridão provocam certo desconforto. Quem atualmente se habitua a esquecer o tempo? A permitir-se a mudez e a reflexão, livre dos bites invasivos dos celulares?

O silêncio é quebrado por um ruído que lembra uma máquina em funcionamento. Não é uma melodia. Não tem harmonia. A máquina parece conter um barulho orgânico. E nisso a liberdade de pensamento cria uma ponte imaginária entre aquele palco/ovo/célula e o pêndulo/esfera/vida. 

O não saber é provocante. Instiga a imaginação. Nos faz reféns do “não-sei-o-quê-mesmo”. De repente, um vulto se impõe. Só um vulto. Um novo facho de luz fotografa cenas fixas de um corpo feminino. Mulher nova, forte, vigorosa. Rosto de anjo. corpo de guerreira. Olhar firme que impacta na borda do palco/ovo/célula. 

Vez em quando, fixa os olhos da plateia. Vez em quando, se estende em direção ao pêndulo/esfera vida. Inicia-se um jogo de sobrevivência angustiante. Longas tentativas de alcançar a esfera, enquanto o pêndulo que parece ter personalidade e autonomia, decide se permite ou não ser alcançado. 

O vigor da personagem traduz sofrimento e êxtase. E impõe o compartilhamento dessa dor/gozo à plateia. Enquanto se movimenta a personagem, que tenta alcançar a esfera num playoff definitivo, quase toca algumas das pessoas no circulo. É incrível ver o que o “quase toque” provoca. Pernas recolhidas, susto, receio do contato. 

É como se a plateia, sem saber ao certo onde chegar, dissesse “é vida, é dor, é êxtase, mas não é meu. Não faço parte disso. Não me encoste”. Até que a esfera se rende. Ou, se dá por vencida. Ou, aceita o jogo. E, finalmente, é alcançada. 

Há uma identidade libidinosa entre a esfera e a personagem. Há cumplicidade. Há invasão de limites. E nisso, quem antes tinha medo do toque, se aventura em rápidas carícias ao pêndulo/esfera/vida. Passa em nossas mãos com a rapidez da vida. Zás! Segue pra outro ponto da plateia. 


A trilha/ruído sonoro incorpora batidas binárias de um coração tambor. O jogo entre personagem e esfera adquire ares de intimidade minimalista. Esfera roça corpo, que roça esfera, que invade corpo, que toca esfera num ritual de sedução e magia. Até que os dois corpos se unam em uma coisa só. O cio vence o cansaço. A vida é ligeira e única.

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