Para Mauro Di Deus
cartaz do documentário Cuba Jazz |
Por várias vezes, sonhei com Cuba, mas nunca fui lá. Talvez, pelo fato de ter nascido também em uma ilha, São Luis, Cuba não me seja estranha. Um pedaço de terra cercado de água por todos os lados, na definição clássica da Geografia. Eu nunca fui a Cuba. Talvez, ainda vá. Mas nunca fui lá.
Entretanto, não foram poucas as vezes que Cuba me alcançou. Em minha memória mais remota, lembro de Maria Aragão, uma comunista histórica. Médica. Maranhense, como eu. De quem ouvi meu pai falar com muita dignidade – ela cuidava de gente pobre como poucos cuidavam. E era comunista. E meu pai, militar.
Quando saí do Maranhão e cheguei ao Sul, descobri os ícones da rebeldia juvenil que me apontavam um universo novo, desconhecido e provocante. A estrela vermelha, o charuto, a barba, o conjunto de elementos que retratava uma ideologia e muitos sonhos. Igualdade, solidariedade, fraternidade, justiça. Um pacote de novidades novas em meu ideário juvenil.
Sempre me perguntei em silêncio contido o que o Chê fazia quando o fotógrafo fez a foto eterna dele. Sabia que estava sendo fotografado? Já se sabia ícone? Tinha noção do quanto influenciaria a juventude por décadas e décadas? Perguntas que ficaram sem resposta. E seguem ecoando no vale das memórias primais.
Depois, pouco depois, ouvi clássicos de uma música que tinha molejo e me alcançava por dentro, num sentimento que mesclava melancolia e tesão. Pablo Milanês e Milton; Chico e Silvio Rodrigues traduziam uma mistura sonora inédita e íntima. Os meus ídolos daqui e os de lá se entendiam bem. Como não os compreender? Por que não considerar seus valores, sua poesia? Sua história?
O médico que fez o nascimento de Mariana e Gabriel, Paulo Correia da Costa, era um comunista histórico. E era uma delícia conversar com ele e desfrutar de seu conhecimento, de sua amizade, de sua companhia.
Jamais esquecerei a cena de Paulo, entre as mesas do bar da Tia, em Campo Grande, simulando ter duas maracas nas mãos, fluindo leve, por trás dos óculos de fundo de garrafa, ao som de uma rumba. Um cubano en la noche de la vieja Habana.
Depois o discurso, longo discurso de Fidel foi esmaecendo. Depois veio a enxurrada de informação, depois veio a dúvida. E com ela, um mar de incertezas. E quem disse que as certezas são necessárias. A poesia, sim.
E foi a certeza da poesia, embalada pela música, que me levou de volta a Cuba, sem que eu nunca tivesse estado por lá. Quando Mauro e Max me alcançam as primeiras cenas de “Cuba Jazz” havia ali uma Cuba cheia de amor e contradição. Sem que uma precisasse vencer a outra.
Max Alvim e Mauro Di Deus |
Torna-se fácil perceber que a riqueza de tudo vai bem além das ondas que quebram, ao mesmo tempo, fortes e ternas nos muros limites que nos lembram – é ilha, não continente. Entre o mar e a terra, entre a luz e o continente há um novo e generoso brilho carregando a essência de um povo que nunca se perdeu no isolamento.
É quando enxergo em Cuba a Madre Deus do menino que não sai de mim. É quando me emociono com o suor e o sorriso da baterista negra que invade o tambor com a intimidade de um carinho feminino, língua quente em metal rijo, boca de mil dentes brancos, sorriso de quase nuvem. Como não se apaixonar?
Meus velhos espíritos reencarnando inteiros. Ah, Maria Aragão; ah, Paulo Correia da Costa. Eis ai a prova de que Einstein tinha alguma razão. Tempo e espaço são bem mais que uma dimensão. A nova geração da música cubana desconhece limites, ignora fronteiras, não se rende a bloqueios.
E trafega em alta velocidade pela ponte arquitetada nas lentes incontroláveis de Mauro e Max. Que são dois, mas que podiam ser um só. Que conduzem com maestria, sem qualquer sinal de desculpa uma nova linguagem documental. Cuba jaz? Bem capaz! Cuba Jazz.
Excelente artigo.
ResponderExcluirEita texto bom se ler!
ResponderExcluirAmigo, Cuba não é uma ilha, é um universo à parte.
ResponderExcluirhttp://diariodecaminhosedestinos.blogspot.pt/2009/10/coisas-que-observei-no-caminho.html http://diariodecaminhosedestinos.blogspot.pt/2009/03/olhos-por-todos-os-lados.html
http://diariodecaminhosedestinos.blogspot.pt/2009/09/conservando-o-que-ja-existe.html
Querido amigo Maranhão! Eu fui a Cuba e fui ver o documentário do Maurinho! Estou de queixo caído p a sensibiidade, criatividade e leveza do teu texto! Perfeito! Titobecon@gmail.com vamos prosear...
ResponderExcluirVc é poesia pura. Até sem querer ser. Orgulho de ser sua amiga.
ResponderExcluirÉ sempre bom ler seus contos amigo. Parabéns!
ResponderExcluirE aí, Maranhão! Te achei de novo, te li novamente. Maravilhoso ao quadrado. Vamos prosear! 61- 986232305. Uso muito o zap e pouco o email. titobecon@gmail.com
ResponderExcluirEm setembro não vamos a Cuba mas vamos fazer um roteiro belíssimo pelo Norte da Argentina e Chile. Excursão tri-boa!Bora lá?