Não me lembro direito quando foi a primeira vez que a vi.
Lembro que desde aquele dia, nunca mais minha vida foi igual.
Para os meus olhos, doidos por ela, Margot - Margarida Gomes Marques, carregava
aqueles cabelos brancos, reluzentes, que lhe conferiam altivez, elegância, beleza
e maturidade. A dignidade, nela, era uma espécie de segunda pele. Havia sempre,
e muito, e tanto que a gente costumava ficar encantado com aquilo.
Ela esteve presente quando o Estado novo foi criado. Foi lá
por 79. O Mato Grosso se dividia em dois. Nascia o Mato Grosso do Sul. Ela
ajudou a contar a história daquela gente, enchendo as páginas dos jornais por
onde passou, com histórias de vida tão distintas quanto a dela.
Gaúcha, comunista desde criancinha e com um senso de justiça
e solidariedade incomparáveis. Quando a conheci, estava no auge. Tinha carro,
casa com piscina, mas não ligava muito pra isso, era desapegada dos bens
materiais.
Mas era apaixonada pela arte. Sua casa mais parecia um museu.
Um Louvre particular composto por peças, em sua maioria, feita por gente
conhecida. Margarida não tinha dinheiro pra comprar arte. Mas o seu respeito
pelo artista, a compreensão da sua importância e a sua capacidade de agregar
eram plenamente reconhecidos e recompensados.
Gratidão em forma de quadros.
Seus quadros na parede não eram quadros na parede. Eram o
espelho dos próprios artistas, um pouco da alma de cada um deles transfigurada
e entregue, de coração, para enfeitar os dias e noites das casas onde ela
habitasse. Ah, as casas da Margarida...
Ela passou por várias. E todas elas tinham em comum a mesma
energia agregadora. A casa de Margot era ponto de encontro. Ponto de partida de
movimentos sociais. Ponto de chegada de amores e paixões. Ponto de mutação para
vivências políticas, filosofias e loucas utopias.
Com Margot bebi alguns dos melhores vinhos da minha vida. Não
pelo preço, pela casta, pelo corte da uva ou pela origem, não. Os vinhos que
bebemos juntos foram alguns dos melhores da minha vida pelo sabor da
companhia.
Na companhia de Margot, ri, chorei, vibrei, perdi, venci,
amei, fiz poesia, falei bobagem... E ela, sempre ali, temperando as minhas
emoções, me ajudando a ver o horizonte sob um outro prisma, segurando a minha
mão, me acolhendo.
E eu penso ter retribuído com a minha fidelidade, com o meu
amor, com a minha amizade. Margot era mais, era minha comadre. Madrinha de
minha filha Mariana. Margot era da família. Aquela família que a gente escolhe,
que junta com o passar do tempo e que é para sempre.
Quando mudamos para Brasília, Margot foi de longe a pessoa
que mais vezes nos visitou. Quando vinha, era uma alegria. Vinha para
descansar, ganhava livros e café na cama.
Hoje, se ainda estivesse aqui, Margot estaria de
aniversário. 11 de dezembro. Hoje, 11.12.13, essa estranha combinação numérica,
me fez acordar prestando atenção no dia e pensando várias vezes nela.
Sua página no facebook continua ativa. E ela ainda recebe
mensagens de quem desavisadamente ainda acha que ela esteja entre nós. No meu
caso, acho que ela está sim, por perto.
Por isso escrevo.
Pra falar do que sinto e do que ela foi e
do que sempre será.
Uma amiga, um amor, um quadro de arte na minha parede emocional. Onde quer que você esteja, Margot, um brinde e
um gole do meu melhor vinho.
Lindo, como só quem ama pode escrever e descrever. É o coração que desenrola as palavras, feito um tapete para passar. Um tapete vermelho para Margot.
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