Por Innocêncio Viégas*
Chegou dezembro, e com ele, todas as alegrias de final de ano, quando a esperança em melhores dias se renova.
Papai Noel age no anonimato; na calada da noite. Isso tudo, no imaginário das crianças, mesmo aquelas que sabem que são os pais que lhes dão os presentes. Poucos notam que a figura do Papai Noel é apenas um mote para que o doador não se identifique como tal. Todas as vezes que você deu um presente sem se identificar, fazendo uma pessoa feliz, você foi o Papai Noel vivificado.
Zé Catador vive de catar latinhas, papelão, plástico, ferro-velho e outros inservíveis para muitos. Mora num barraco com a mulher e um guri de uns três anos. Vivem na maior pobreza mas o alimento não falta. O menino só fala em Papai Noel. Nos papéis que o Zé traz para casa, vez por outra o Papai Noel aparece estampado nos anúncios que ele e o Zé não sabem ler. O Zé fica preocupado com os desejos da criança e lamenta não ver em sua casa, pelo menos por um minuto, o Papai Noel tão falado por todos.
Certa noite o Zé fazia o seu serviço, honesto, quando deparou com um grande boneco vestido de Papai Noel, na porta de uma loja de brinquedos. Logo lhe veio à cabeça a figura do seu filhinho. Não perdeu tempo. Tirou o gorro do boneco e o colocou em sua cabeça. Olhou-se no vidro da vitrine e se achou parecido. Sacou o blusão colorido e se vestiu. Ficou um pouco grande. A calça e as botas não eram verdadeiras e sim de papel mas o grande saco, pleno de papéis lhe serviria para levar os presentes. Retirou do boneco o grande saco e o colocou no ombro. Virou Papai Noel. Lindo! Agora eu sou ele, conversou consigo mesmo. Compro os presentes para o Zezinho, uma roupinha para a Mari, um franguinho assado, batatas, refrigerantes e, para mim, uma garrafa de cidra e tá feito o Natal.
O Zé estava sendo filmado, e na outra esquina foi preso pela patrulhinha do bairro. A TV noticiou o caso com estardalhaço e mostrou para o mundo, o pobre Zé. O escrivão fez a ficha criminal do Papai Noel. O Zé contou a sua triste história. Não queria furtar nada, era a única maneira de fazer a alegria do filho e da mulher, e completou o seu depoimento: Doutor, lá no meu barraco, o Papai Noel nunca apareceu.
O Delegado recolheu pessoalmente os pertences do Papai Noel – o gorro, o blusão e o saco – confirmou o endereço do Zé: um barraco na beira da pista, depois do posto de gasolina, no Km 25 , único barraco.
O Delegado tinha o coração sensível ao bem e mandou soltar o Zé, mandou-o voltar para o seu trabalho. Poucos dias depois, já chegando o Natal, o Zé recolheu na noite anterior, suas latinhas, vendeu o produto do seu trabalho, apurou um dinheirinho e foi comprar os presentes.
Ao chegar em casa, se assustou. O barraco todo enfeitado com balões coloridos e guirlandas. Lá dentro, o menino abraçado com vários brinquedos e a Maricota, de vestido novo e muito sorridente com os alimentos recebidos.
– O que aconteceu aqui Mari? Perguntou.
– Zé – respondeu a Maricota – o Papai Noel esteve aqui, perguntou por você. Deixou tudo isto. Mas ele não era bem um Papai Noel. Tinha o gorro, o blusão colorido e o saco, mas não tinha a calça vermelha e nem as botas. Perguntei o nome dele e ele disse: Papai Noel, e disse mais: diga para o Zé, que Papai Noel existe, e vez por outra, é até o Delegado. Zé ele saiu rindo e cantando o seu Hô! Hô! Hô! E dizendo: Feliz Natal! Feliz Natal! Feliz Natal!
O Zé não havia contado nada para a sua Maricota. Simplesmente chorou, olhou para o céu e disse:
– É ele mesmo Mari! Papai Noel é assim.
Pode ser qualquer pessoa, até mesmo o Delegado ou um simples catador de latas, aquele que foi preso.
Hô! Hô! Hô! Feliz Natal para todo mundo.
* Innocêncio Viegas é teólogo, membro da Ass. Nac. dos Escritores, membro da Academia de Letras de Brasília, da Academia Internacional Maçônica de Letras, fundador da Confraria dos Amigos da Boa Mesa e meu pai.
Email para contato: inocencio.viegas@gmail.com