Vinícius, na banheira onde trabalhava, recebia amigos e onde terminou morrendo, aos 67 anos. |
E os começos com poesia são sempre melhores do que quaisquer outros. Como uma onda no mar, cruzei a quinta da semana passada participando de um programa de TV, "Canto das Letras" realizado pelo Centro Cultural da Câmara dos Deputados. Uma conversa sobre música, poesia, literatura e vida.
Marco Antunes, Lília Diniz, Goya e Bisol (ao fundo, de chapéu) e eu, misturados à plateia do Canto das Letras |
O reencontro com a emoção da primeira vez trouxe mais. Em pouco mais de uma hora de conversa, fiz muitos novos amigos. Lília Diniz, por estar ao meu lado, foi a primeira. Maranhense, como eu, Lília é uma mulher corajosa e bela. Me diz, em rápidas palavras, que vence a vida com poesia, já faz algum tempo.
Não que seja fácil. mas é, pelo menos, mais verdadeiro e intenso. O programa foi conduzido por Marco Antunes, vai ao ar pela TV Legis (ainda sem data de exibição marcada) e, depois, ficará disponível na internet.
Quando chegou a minha vez de falar, Goya e Bisol já haviam tocado as suas violas. Lilia já havia contado de seus pais, de seus filhos e de seus livros. Restou-me falar de minha origem. Recorri a Mia Couto para lembrar que a distância nos faz refletir sobre a nossa aldeia. E nos faz enxergar o ouro da criação.
Mariana, eu e Gabriel. Filhos na plateia. |
Bisol, eu, Isa e Goya. Conversa inspiradora, presença emocionante. |
Mas houve um momento em especial, que me causou particular emoção. Quando Marco Antunes leu um texto que escrevi, uma viagem poética às minhas origens. Meu raciocínio literário buscou enxergar minha avó, meus irmãos, meus pais e meus quintais. De início, levei um tempo para identificar meu texto. Meus olhos marejaram comovidos quando me identifiquei naquelas linhas.
Não por mim. Mas pelos vestígios de poetas que me habitam - Pessoa, Neruda, Mia Couto, Leminski, Borges, Manoel de Barros. Estavam todos lá, reunidos em meu texto confessional. Engrandecidos pela leitura e interpretação de Marco, me obrigaram a questionar calado - como fui eu que fiz isso?
Talvez, a resposta esteja no mar. O mesmo que banhou a minha curta infância maranhense. O mesmo que me acompanhou pelo interior do Brasil e me acompanha em qualquer lugar do mundo. O mesmo que me habita a alma e a quem recorro, sempre que a vida fica mais triste ou pesada. A vida vem em ondas como o mar.
Lilia, cercada de filhos por todos os lados. |
Ando estado vegetal
experimento
o gosto do vento
na ausência
dos meus cabelos.
Sentindo
o pulsar dos tambores
encantados da aldeia
de minha bisavó,
tocando o agora,
nas aldeias da minha alma
franzina
viajeira
lúdica.
Aprendendo
com o sol, que é,
além das nuvens.
Ando estado argila
maleável aos dedos do tempo
moldável às mãos do amor
macerável aos pés do poema
idônea para minhocas
samambaias e peixes cascudo
habitantes reais
das nascentes
que merejam silenciosamente
nas locas do Eu floresta.
Solvendo
a água sagrada
que escorre dos meus olhos
em noites desprovidas
de vagalumes
e candeias de abraços.
Ando estado poesia
me entregando ao misterioso
cavucar das palavras.
Escavando
fósseis de letrinhas
cravadas nas paredes arenosas
de minha memória.
Querendo,
de algum modo,
servir manjares de versos
preparados ao molho de
estrelas ascendentes
ao banho de lua nova
gratinados com
radiantes sabores solares.
Ando estado feto
sendo feita.
Lilia Diniz
Coisa linda, Maranhão. Tuas palavras e a poesia de Lilia.
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